Políticas de turismo no Rio de Janeiro pós-fusão: programas para interiorização do turismo no estado


Pãmela Ketulin Mattos Gomes
Mestre em Desenvolvimento Territorial e Políticas Públicas pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e professora do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ, Campus Engenheiro Paulo de Frontin).

Lucia Helena Pereira da Silva
Doutorado em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Professora de História e docente permanente do Programa de Pós Graduação em Desenvolvimento Territorial e Políticas Públicas da UFRRJ

1. Introdução

A partir da fusão dos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro em 1975, foi necessária a reestruturação da administração pública na constituição desse novo estado. No campo da máquina administrativa voltada para o turismo também ocorreram transformações, como a transferência da sede da Companhia de Turismo do Estado do Rio de Janeiro (FLUMITUR) de Niterói para a cidade do Rio de Janeiro. Após a mudança, a FLUMITUR continuou atendendo a todo o estado e passou a incluir o território da antiga Guanabara. Essa fusão, de acordo com Fratucci (2006), demonstrou o início de uma preocupação institucional com a interiorização do turismo no estado fluminense pois, com a transferência da FLUMITUR para a cidade do Rio de Janeiro, a companhia passou a ter seu nicho de atuação no interior, enquanto a Empresa de Turismo do Rio de Janeiro (RIOTUR S/A) se focaria no desenvolvimento do turismo na capital. 

A FLUMITUR foi criada em 1960 pelo antigo governo do estado do Rio de Janeiro, da mesma forma em que foi instituída a RIOTUR S/A pelo antigo estado da Guanabara. Esta transformação significou a reestruturação da FLUMITUR, que logo se tornaria a atual TurisRio, sendo o mais relevante o fato de destinar uma repartição pública para desenvolver o setor no interior do estado, fato que viabilizou sistemática interiorização dos fluxos turísticos, constituindo também como instrumento de gestão das políticas do governo federal, aspectos a serem pormenorizados neste trabalho.

Para tratar destes processos foi construído um texto descritivo apoiado por uma pesquisa documental e bibliográfica amparada por teses, dissertações, obras literárias e documentos públicos, materiais que trazem conceitos sobre políticas públicas de turismo, sobre a trajetória destas políticas no Brasil e sobre as ações envolvidas nesse processo (tais como ações de controle, fomento e de fiscalização das atividades), além de materiais que colaboram no entendimento sobre como ocorreu a interiorização de políticas públicas no estado fluminense. Informações relevantes para compreensão do processo de estruturação e desenvolvimento das políticas de turismo no estado do Rio de Janeiro.

O desenvolvimento do texto, dividido em três partes, segue uma trajetória que pretende demonstrar como a legislação e as ações públicas foram importantes instrumentos de interiorização do turismo no estado. A primeira visa resgatar as políticas de turismo constituídas pelos governos federais ao longo da década de 1990; o sentido desta recuperação é apontar a influência destas políticas na formação de uma leitura acerca do turismo no estado. Na segunda parte, o objetivo é apresentar a dinâmica do próprio estado em legislar acerca das atividades turísticas, mostrando como a implantação de ações e programas sob a égide das políticas federais ou estaduais ganharam ritmos próprios e desenvolveram o setor. Finalmente, na terceira parte, discorre-se sobre como esses programas pensaram na prática e efetivaram uma configuração espacial, através da regionalização das atividades de turismo no estado do Rio de Janeiro, no bojo da interiorização.

2. O governo federal e as políticas de turismo na década 1990 

O Plano Nacional de Turismo foi criado nos anos 1990 no cerne de outras políticas setoriais e constituía um conjunto de ações direcionadas ao desenvolvimento do setor através de iniciativas públicas ou de parcerias com o setor privado. As políticas e ações criadas na década de 1990 são entendidas por Dias (2008) como de caráter descentralizador, ordenadas na esfera federal para que governos esta­duais e municipais passassem a ser responsáveis pela gestão do turismo, que muitas vezes delegavam a implantação a terceiros, como no caso do “Projeto Economia da Experiência”, com gestão do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e do Instituto Marca Brasil (IMB).

A Política Nacional de Turismo foi criada pelo Decreto nº 448, de 14 de fevereiro de 1992, e estabelecia as diretrizes para o setor, passando a guiar todas as ações para o desenvolvimento das atividades de turismo em território nacional. As diretrizes de 1992 orientavam uma nova perspectiva para as políticas de turismo, não mais configuradas apenas no controle ou incentivo econômico, como prevaleciam até então. Sendo assim, as novas orientações preconizavam pela inclusão de ações voltadas ao desenvolvimento social, ambiental e cultural dos destinos turísticos (BRASIL, 1992).

Ao lado das diretrizes, no mesmo ano foi criado o Plano Nacional de Turismo (PLANTUR), que pode ser considerado como instrumento básico da política nacional de turismo (CRUZ, 2001). O PLANTUR foi criado como instrumento para o desenvolvimento do turismo regional e consistia em ações detalhadas para tornar efetiva a política nacional de turismo. O PLANTUR foi composto de sete programas, organizados de maneira a estruturar toda a cadeia produtiva do turismo. Foram constituídos sob a égide do PLANTUR os seguintes programas: Programa Polos Turísticos, Programa Turismo Interno, Programa Mercosul, Programa Ecoturismo, Programa Marketing Nacional, Programa Qualidade e Produtividade do setor de turismo e Programa de Formação dos Recursos Humanos para o Turismo (CRUZ, 2001). Os programas do PLANTUR não saíram do papel, restando apenas as diretrizes da PNT e o PLANTUR. Segundo Paula (2009), o PLANTUR incorporou em suas ações o “[...] compromisso com a eficiência administrativa, maior interação com a iniciativa privada, bancos e organismos internacionais, a modernização operacional, a desregulamentação e a facilitação das atividades turísticas” (p. 47). Os programas do PLANTUR só se tornaram ações práticas no governo seguinte.

Após o impeachment do presidente Fernando Collor (1992) foi criada a Secretaria Nacional de Turismo e Serviços, vinculada ao recém-criado Ministério da Indústria, Comércio e Turismo, o que elevou as atividades de turismo como objeto de política comum aos demais setores da economia. No final do governo de Itamar Franco, em 1994, foram lançados dois novos programas, Diretrizes para uma Política Nacional de Ecoturismo e o Programa Nacional de Municipalização do Turismo (PNMT). O primeiro tinha pretensão de valorizar o meio ambiente dos destinos turísticos, considerando atividades de conservação e valorização ambiental para compor as políticas de turismo, e incluía discussões de proteção ambiental que já circulavam no meio acadêmico e nas esferas não governamentais. Contudo, era mais uma política de turismo voltada à mercantilização da natureza e cultura brasileira (CAVALCANTI; HORA, 2002) do que desenvolvimento do setor propriamente dito. O segundo, o PNMT, pretendia expandir a infraestrutura dos municípios turísticos, fortalecendo relações entre os órgãos públicos e setor privado local.

A gestão de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) manteve os mesmos princípios das políticas anteriores. Um exemplo disto foi a “Política Nacional de Turismo: Diretrizes e Programas – 1996/1999” (PNT). O documento estabelecia estratégias, metas e objetivos destinados ao setor de turismo para serem desenvolvidos em três anos. Naquele período foram desenvolvidos pelo governo federal o Programa de Ação para o Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (PRODETUR-NE); o PNMT; o Programa Nacional de Ecoturismo; o Programa de Formação Profissional no Setor Turístico; e o Plano Anual de Publicidade e Promoção (DIAS, 2008, p. 136). Os novos programas instituídos consolidaram a descentralização do turismo no território nacional, construindo um novo ordenamento territorial, tendo como executores estados e municípios, aliás, configuração que prepondera atualmente.

A PNT de 1995 tinha a finalidade de promover e incrementar o turismo visando gerar emprego, renda e desenvolvimento socioeconômico nos destinos turísticos. As ações da PNT buscavam atingir alguns objetivos considerados estratégicos, devido ao seu caráter estrutural, tais como o “Fomento, defesa do consumidor; Desenvolvimento Estratégico; Busca da qualidade dos serviços; Descentralização; Conscientização da sociedade brasileira para a importância do turismo; Articulação intra e extragovernamental; Democratização do turismo interno; Promoção externa; Inserção internacional do turismo brasileiro” (CAVALCANTI; HORA, 2002, p. 61).

O PNMT, importante programa dentro da PNT, pretendia expandir a infraestrutura dos municípios turísticos, fortalecendo relações entre órgãos públicos e a iniciativa privada local. Segundo Oliveira (2008), a atuação do Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR) teve grande relevância no programa, inclusive por ser responsável pela seleção dos municípios prioritários que seriam atendidos pelo programa. Para isso, em 1996, a EMBRATUR criou o Roteiro de Informação Turística (RINTUR), que foi o método utilizado para selecionar os municípios prioritários que desejassem participar do programa. O município candidato precisava elaborar seu próprio roteiro de informações turísticas, que deveria ser atualizado anualmente. A partir dos roteiros elaborados, os municípios seriam avaliados, selecionados e classificados como “turístico” (turismo consolidado) ou “de potencial turístico” (turismo em desenvolvimento). Ao ser selecionado, o município estava apto para concessão de financiamentos públicos, que o governo municipal com sua autonomia, seria capaz de planejar e executar para melhor desenvolver o turismo local (OLIVEIRA, 2008, p. 189). Esse processo marca a descentralização das políticas de turismo, através da autonomia dos municípios no processo de decisão, e a figura do governo federal passa a ser apenas de orientador das políticas, cabendo ao município a decisão e execução de ações voltadas ao turismo, de acordo com suas peculiaridades e necessidades políticas locais.

A política de turismo da década de 1990 fundamentou a atual política ao orientar as ações de turismo para outras escalas de governo. Assim, a descentralização dividiu competências entre estados e municípios. A partir do paradigma do neoliberalismo da década de 1990, a gestão pública além de ser repartida entre escalas de governo, também era dividida com o setor privado, o que na prática, fazia com que o Estado chancelasse investimentos internacionais de interesse do capital externo (PAULA, 2009). Essa configuração política dos anos 1990 chega ao século XXI e se perpetua nos atuais governos, caracterizando a condução das políticas públicas para o turismo de hoje, organizadas por estados e municípios.

O PRODETUR nacional destaca-se como política pública de turismo por se manter há quinze anos no cenário nacional, mesmo com mudança de governos, fato que pode estar associado à sua subordinação ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), financiador do programa. Isto significa uma dívida continuada mesmo que haja mudanças de governo. Essa ação é um exemplo das atuais políticas de turismo concebidas nos últimos anos, descentralizadora, por transferir a responsabilidade de gestão do programa entre estados, distrito federal e municípios (de no mínimo um milhão de habitantes) e ainda neoliberal, por conta da subordinação às instituições internacionais como o BID, principal financiador do programa, e deixar a consecução às empresas terceirizadas.

Na década de 1990, sob a égide do neoliberalismo, as políticas promovidas pelo estado brasileiro reforçaram as parcerias com o setor privado e a descentralização de gestão, tornando as unidades federativas responsáveis pela administração e consecução das ações, projetos e programas formulados pelo governo federal. Os governos do estado do Rio de Janeiro, naquele período, buscaram articular as políticas constituídas na instância federal com o processo local de desenvolvimento das atividades turísticas que estavam em curso.

Em 2003, no Governo Lula, foi implantado o Plano Nacional de Turismo pelo recém Ministério do Turismo, com ações organizadas para os anos de 2003 a 2007. Foi neste plano que o governo federal sinalizou pela primeira vez a proposta da regionalização do turismo, posto que ocorriam em muitas unidades da federação discussões entre as esferas municipal e estadual (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2013). A proposta do plano foi viabilizada pelo Programa de Regionalização do Turismo (PRT), iniciado em 2004, com o objetivo de dar continuidade ao processo de ordenamento territorial do turismo no país. Nesse momento, não mais se limitando ao município (como o programa PNMT), as ações ampliavam sua abrangência para escala regional, agrupando municípios, que juntos se fortaleceriam e desenvolveriam estratégias regionais para o desenvolvimento econômico e social através do turismo (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2004). 

O PRT se consolidou tendo sequência nos Planos de 2007 a 2010 e no atual, de 2013 a 2016. No atual Plano Nacional de Turismo, a regionalização do turismo se manteve como um procedimento. Sua avaliação aponta para a “[...] necessidade de novos desafios, notadamente no que diz respeito à construção de uma estratégia de fortalecimento e posicionamento do turismo a partir da organização das regiões com abordagem territorial e institucional para o desenvolvimento e a integração do turismo no Brasil” (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2004, p. 56). 

A partir da regionalização turística do território brasileiro, o governo federal promoveu algumas ações direcionadas às regiões turísticas instituídas pelo PRT confirmando “[...] a importância do Programa como instrumento político, essencial à consolidação dos destinos, e como promotor de desenvolvimento econômico e social nas regiões turísticas” (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2013, p. 34). Neste contexto o Projeto Economia da Experiência foi uma das ações instituídas em 2006, organizada através de parcerias com o setor privado, no caso com o SEBRAE nacional e o IMB,1 primeiramente no Sul do país, depois expandido para outros destinos turísticos do Brasil, inclusive no estado do Rio de Janeiro. Esta ação visou à expansão da oferta e movimentação da cadeia turística da região a partir de atividades que oferecessem experiências diferenciadas ao turista, propiciando a potencialização de diferentes sensações e vivencias próprias da localidade, com características culturais peculiares (MINISTÉRIO DO TURISMO et al., 2010).

O Tour da Experiência é a extensão da mesma proposta, com adequações de “marketing” que foram incorporadas após o trabalho realizado na região da Serra Gaúcha, passando a ser entendida como uma “marca”, e identificada nos empreendimentos onde o turismo de experiência foi implantado e desenvolvido. Todo o conceitual da marca Tour da Experiência foi construído pelo IMB, que elaborou a logomarca a pedido do Ministério do Turismo. O desenvolvimento da marca foi considerado como um elemento chave para divulgação e competição dos destinos turísticos envolvidos do Projeto Economia da Experiência.

Segundo Beni (2005), “[...] a economia da experiência chegou para ficar e expandir-se” (p. 301) e representa uma revolução já que traz uma ruptura com as formas tradicionais de turismo ao privilegiar a diferenciação de produtos e serviços com inusitada penetração no mercado. Nesta nova forma de pensar o turismo (e a economia), a organização das atividades prioriza as que oferecem mais do que lazer e distração, já que novos produtos serão capazes de transformar uma simples visitação em algo “inesquecível”, despertando várias “sensações e emoções” ao turista. 

O Projeto Economia da Experiência teve continuidade com o “Projeto Economia da Experiência: continuidade e abrangência de novos destinos”, ao longo dos anos de 2008 e 2009 e manteve a mesma estrutura de governança, tendo como realizadores o Ministério de Turismo em parceria com o SEBRAE nacional e a gestão entre IMB e unidades do SEBRAE das localidades implantadas. Na prática, o projeto continuou a aprimorar a marca nacional e o Selo Tour da Experiência passou a ser instrumento de autenticação de estabelecimentos que trabalhassem em suas atividades o conceito da experiência.

3. Políticas de turismo no estado do Rio de Janeiro pós-fusão

A fusão uniu dois estados da federação que apesar de estarem imbricados pela dinâmica de sua população e economia sempre estiveram separados pela burocracia. A estruturação da administração do novo estado combinou, mantendo-as separadas, as duas repartições públicas voltadas para o turismo. A FLUMITUR passaria efetivamente a desenvolver ações para a interiorização das atividades turísticas no estado fluminense, além de ser o principal instrumento de gestão das políticas do governo federal, enquanto a gestão do turismo na cidade do Rio continuou a ser organizada pela empresa municipalizada RIOTUR. 

A Companhia de Turismo do Estado do Rio de Janeiro, empresa de sociedade mista, onde o governo estadual possui 68,48% das ações, em 1988 teve a marca FLUMITUR alterada para TurisRio, e era parte da estratégia de marketing proposta pela campanha “Cidades Maravilhosas do Estado do Rio de Janeiro” (1988-1990). A campanha pretendia promover municípios vizinhos à cidade do Rio de Janeiro que tivessem alguma estrutura para receber visitantes. De acordo com Fratucci (2005), não houve critérios para escolha destas cidades e as escolhas foram baseadas em dados empíricos e pela experiência pessoal dos diretores da TurisRio. Desta forma, as cidades de Angra dos Reis, Paraty, Visconde de Mauá (distrito de Resende), Itacuruçá (distrito de Mangaratiba), Itatiaia, Armação de Búzios, Nova Friburgo e Petrópolis tornaram-se as “cidades maravilhosas”, escolhidas como centros receptivos para demandas interestaduais e internacionais.

A campanha além de incentivar o turismo nas cidades escolhidas foi alvo de críticas e reclamações por conta daqueles que não foram incluídos, ainda que se aproveitassem da campanha para fazer sua própria propaganda, criando estratégias para promover suas atividades turísticas, como foram os casos de Macaé, Paty do Alferes e Vassouras (FRATUCCI, 2005). A campanha foi, de forma geral, importante instrumento de promoção das cidades do estado. 

Entretanto havia desigualdade de recursos, organização e conhecimento das atrações turísticas entre a cidade do Rio de Janeiro e o interior do estado, onde suas atrações foram exploradas apenas depois dos anos 1990, o que demonstra o desenvolvimento tardio do setor de turismo fluminense. A campanha “Cidades Maravilhosas do Estado do Rio de Janeiro” foi uma das ações que buscaram integrar destinos do interior do estado aos roteiros turísticos do Brasil, que antes se limitavam à cidade do Rio de Janeiro. Entre as décadas de 1960 e 1980, o interior fluminense possuía poucas localidades com a atividade turística em desenvolvimento. A prática turística ficava restrita apenas às cidades de Teresópolis, conhecida por conta da montanha nomeada de Pico do Dedo de Deus; Petrópolis, famosa por ter sido cidade de veraneio da família imperial; o Parque Nacional de Itatiaia; ou ainda Cabo Frio, que foi divulgada internacionalmente após aparições da famosa atriz francesa Brigitte Bardot na praia de Búzios, antes da localidade transformar-se em município (FRATUCCI, 2005). 

O desenvolvimento de políticas para a área de turismo no estado do Rio de Janeiro não só foi tardio como também lento, considerando o tempo desprendido para construção do Plano Diretor de Turismo. Apesar da constituição do estado ter sinalizado a importância do Plano Diretor de Turismo em 1989, ele só começou a ser elaborado em 1997, sendo lançado em 2001. Sua construção foi iniciada pela TurisRio e pela Secretaria de Estado e Planejamento (SECPLAN), mas somente a partir da gestão do governador Anthony Garotinho (1999) que o plano foi elaborado de fato, isso por conta do auxílio do BID que disponibilizou recursos financeiros permitindo a contratação da empresa portuguesa de consultoria DHVMC-Management Consultants Ltd. (LIMA, 2014), que contribuiu no desenvolvimento do documento. 

A TurisRio e a SECPLAN tiveram como atribuições levantar, analisar e consolidar os dados, documentos e programas existentes e intervenientes com a questão turística estadual. A construção do plano contou também com a colaboração de outros órgãos estaduais e de todos os municípios do estado do Rio de Janeiro. A elaboração do Plano Diretor de Turismo (PDT) do Rio de Janeiro estava relacionada à necessidade de formular diretrizes e organizar ações para o desenvolvimento das atividades de turismo para todo o  estado. 

O PDT passou a delinear ações para atender as diferentes necessidades ao desenvolvimento do setor dentro do estado e foi organizado em dois relatórios. O primeiro volume apresentava as atividades turísticas desenvolvidas no estado naquele momento e o segundo volume trazia diretrizes e propostas de cinco Macroprogramas subdivididos em 12 programas, tendo cada programa projetos específicos, como descrito no Quadro 1.

Quadro 1  – Programas do Plano de Ação Estadual

Com a conclusão do PDT, o governo tinha sua primeira política estadual de turismo estabelecida em lei, orientando agentes públicos e privados para o desenvolvimento de ações de planejamento e organização do setor de turismo. Paralelamente à elaboração do PDT fluminense, vigorava na esfera federal o PNMT.

Antes do estado fluminense ter seu plano diretor de turismo, seguia diretrizes nacionais como o PNMT que vigorou entre 1993 e 2003, sendo colocado em prática pelo governo estadual apenas a partir de 1998 (DIAS, 2008). O PNMT, em seu período de vigência no estado, teve grande importância para o processo de mobilização/sensibilização dos municípios fluminenses, por conta da constituição dos muitos conselhos de turismo instituído nesse período, desenvolvendo lideranças locais, fundos municipais próprios e planos estratégicos (TURISRIO apud LIMA, 2014).

Para Fratucci (2005), o PNMT também foi importante por gerar uma nova orientação das políticas de turismo no estado do Rio de Janeiro, principalmente pelo incentivo à gestão do turismo local, mas que acabou instigando formas de liderança do turismo em escala regional. A nova configuração não mais trataria do setor de turismo na esfera municipal como o programa pretendia, já que uma construção regional foi provocada pelos encontros entre secretários (gestores do turismo), funcionários municipais, empresários do ramo, conselheiros e associações, mediados pelas oficinas de capacitação do PNMT. Estas oficinas geravam discussões sobre a necessidade das atividades do turismo serem planejadas em conjunto, organizadas entre os setores públicos dos municípios que possuíam interesses comuns (FRATUCCI, 2005).

O PNMT foi uma ponte para a organização de grupos regionais, ao ser espaço de discussões entre representantes do turismo municipal, embora esta não tenha sido uma ação prevista pelo PNMT. Assim, formaram grupos regionais, como o Conselho Regional de Turismo da Região das Agulhas Negras (CONRETUR), formado pelos municípios de Resende, Itatiaia, Quatis e Porto Real. Outro fruto desta ação foi a criação do Conselho Regional de Turismo do Ciclo do Café (CONCICLO), que em sua composição inicial era composto por dez municípios, entre eles Valença, Vassouras, Barra do Piraí e Rio das Flores. O CONCICLO foi organizado por representantes da sociedade civil com a Organização Preservale (organização não-governamental que reúne proprietários das fazendas do período “ciclo do café”). A pretensão desses agrupamentos era fortalecer uma identidade turística regional e desenvolver as atividades de turismo de forma integrada entre municípios com atrativos turísticos similares (FRATUCCI, 2005). Esses movimentos espontâneos gerados entre municípios não faziam parte das diretrizes do PNMT e eles não ocorreram apenas no Rio de Janeiro; aconteceram em outras partes do Brasil, como no Sul do país, em municípios da Serra Gaúcha. Essas organizações regionais originárias da época do PNMT colaboraram para o desenvolvimento do PRT, o qual até hoje orienta muitos programas e projetos, como o Tour da Experiência na Região do Vale do Café fluminense ou Uva e Vinho na Serra Gaúcha.

De forma geral, o processo de ordenamento do turismo fluminense acompanhou a esfera federal, e foi construído por 

[...] experiências pontuais e assistemáticas, o que dificulta uma análise mais profunda dos seus resultados, principalmente pela não continuidade nos processos de implantação e pela quase inexistência de dados e documentação escrita (FRATUCCI, 2000, p. 76).

Tal como Fratucci (2000) aponta, apesar da descontinuidade e fragmentação das ações, já que a implantação das políticas era dispersa, grupos regionais formaram-se, e nesse processo uma nova dinâmica de pensar e organizar as atividades turísticas foi consolidada, garantindo aos grupos mais estruturados a captação dos recursos e o atendimento do próprio estado.

4. O processo de regionalização das políticas de turismo no estado do Rio de Janeiro

O processo de regionalização das atividades do turismo no Rio de Janeiro potencializou uma nova escala para a organização de ações voltadas aos municípios fluminenses, já que se direcionaram para regiões e não mais para cidades, como era feito anteriormente com o PNMT. Três acontecimentos são responsáveis pela consolidação da regionalização turística do estado do Rio de Janeiro: primeiro, a ação dos grupos regionais que se organizaram durante a vigência do PNMT; segundo, a distribuição das regiões turísticas fluminenses a partir do plano diretor (2001); e terceiro, a política nacional de regionalização, através do PRT (2004). 

Na realidade, o processo de regionalização do turismo fluminense era um movimento anterior às políticas descentralizadoras do PNMT. De acordo com Fratucci (2005), de forma institucionalizada oficialmente, a proposta fazia parte do Plano de Desenvolvimento Econômico e Social (1980-1983), que criou uma regionalização oficial durante a gestão Chagas Freitas (1980) e tratava-se de uma divisão do território estadual em seis regiões turísticas: Metropolitana, Costa Verde, Costa do Sol, Norte, Serramar e Serrana. Na época, a divisão tinha como objetivo facilitar os estudos microrregionais e o planejamento da atividade turística. As regiões foram denominadas e organizadas de acordo com a homogeneidade e complementaridade de recursos disponíveis para o turismo, o que agrupava os municípios conforme suas características geomorfológicas, culturais e dentro dos limites político-administrativos. A distribuição regional da década de 1980 durou até a instituição do Plano Diretor de Turismo do Rio de Janeiro (2001), que redimensionou os espaços turísticos, já que transformações socioeconômicas haviam ocorrido no período. A emancipação de 28 novos municípios entre 1985 e 1999 é um exemplo que provocou mudanças nas relações entre as regiões anteriormente organizadas. 

Uma justificativa para a reorganização regional do turismo pelo Plano Diretor de Turismo fluminense, segundo Fratucci (2006), não está explícita no plano, visto que a necessidade de pensar as regiões não se fazia somente por suas semelhanças geográficas etc., mas também pelas demandas mercadológicas comuns encontradas nos municípios. Por exemplo, municípios direcionados para o segmento do turismo rural conseguem se articular melhor entre municípios de características rurais, o mesmo para o segmento praia, serra etc. 

Como herança desta distribuição regional da década de 1980 ficaram as denominações regionais utilizadas até hoje como a região Costa do Sol, formada pelos municípios de Maricá, Saquarema, Araruama, Arraial do Cabo, Cabo Frio, São Pedro da Aldeia, Rio das Ostras, entre outros. Estes movimentos regionais induzidos indiretamente por ações da TurisRio ou pelo PNMT “[...] geraram um rearranjo na organização territorial do turismo no estado, o qual não pode ser ignorado pelos órgãos públicos estaduais e federais” (FRATUCCI, 2005, p. 102) no momento de diagnóstico e de elaboração do Plano Diretor de Turismo.

De acordo com o documento PDT (2001), as “[...] Regiões Turísticas têm como objetivo primordial a organização territorial e a gestão da atividade turística, constituindo uma estância intermediária de articulação entre o Estado e os municípios” (SEPDET/TURISRIO, 2001, p. 98). Assim, municípios foram agrupados de acordo com inter-relações de identidade geográfica, paisagística e territorial, da mesma forma que ofertas em infraestrutura e serviços no intuito de gerar regiões com “homogeneidade e complementariedade” (SEPDET/TURISRIO, 2001, p. 98). Para o agrupamento dos municípios foram utilizados os seguintes critérios:

  • Identificação, características e extensão dos recursos turísticos, tendo em atenção aspectos relacionados, por exemplo, ao valor apelativo dos atrativos em relação aos segmentos de mercado identificados ou à necessidade de intervenção em certas áreas com problemas de ordenamento e ocupação do solo;
  • Tipologia, dimensão e categoria da oferta de equipamentos e serviços turísticos, e condições de infraestrutura de apoio, com destaque para a conveniência dos acessos, principalmente no que se refere à rede rodoviária, buscando a adequada escala no que se refere à gestão territorial; e
  • Incidência espacial da oferta turística atual, tendo em atenção aspectos relacionados, por exemplo, com a concentração, diversidade ou complementariedade dos atrativos turísticos, dentro de um espaço suficiente limitado para permitir a criação de círculos e roteiros com vistas a diferentes atrações e recursos (SEPDET/TURISRIO, 2001, p. 98).

Partindo destes critérios foram integrados todos os municípios do Rio de Janeiro, até mesmo os que não possuíam fluxo turístico, o que gerou 13 regiões turísticas. Diante desse grande número de regiões, o mesmo plano propõe Áreas de Desenvolvimento Estratégico (ADEs), organizadas a partir das 13 regiões turísticas com propósito de agrupar estrategicamente as regiões com semelhanças quanto à sua identidade para promoção e marketing (ver Figura 1). Dessa forma, as regiões turísticas se compõem por municípios e as ADEs se compõem de regiões. Essa reconfiguração regional estratégica gerou oito ADEs, que algumas vezes são compostas por uma única região, outras vezes por duas ou três regiões. Para esta nova regionalização, cujo mote era o desenvolvimento estratégico, foram utilizados como critérios os recursos enquanto atrativos e a oferta de equipamentos, além dos serviços turísticos existentes (SEPDET/TURISRIO, 2001).

Figura 1 – Mapa Áreas de Desenvolvimento Estratégico (ADEs)

Figura 1 – Mapa Áreas de Desenvolvimento Estratégico (ADEs)

Fonte: SEPDET/TURISRIO, Plano Diretor de Turismo do Estado do Rio de Janeiro (2001, p. 103).

Uma das consequências deste procedimento foi a discussão da regionalização como estratégia para o turismo em todo âmbito nacional, já que foi utilizado como instrumento o Plano Nacional de Turismo, implantado pelo Ministério do Turismo em 2003, com ações previstas para os anos de 2003 a 2007. Como já foi dito, o plano sinalizou pela primeira vez a proposta da regionalização do turismo nacional, pois assim como acontecia no Rio de Janeiro, havia discussão entre as esferas municipal e estadual em outras unidades da federação. O recorte espacial foi colocado dentro do plano através do PRT, iniciado em 2004, com o objetivo de dar continuidade ao processo de ordenamento territorial do turismo no país, agora não mais se limitando ao município (como o programa PNMT), agrupando-os para que juntos elaborassem políticas próprias no campo do desenvolvimento econômico e social através do setor de turismo (DIAS, 2008). 

O PRT no estado do Rio de Janeiro teve como objetivo facilitar a implementação de políticas públicas distribuídas através da configuração geográfica iniciada pelo Plano Diretor de Turismo. Com esta nova orientação para organização regional, novas intervenções foram promovidas, a exemplo do Programa de Desenvolvimento Regional do Turismo Nacional (PRODETUR Nacional), neste caso não somente para o estado do Rio de Janeiro como também para outros estados que participaram do programa.

O Programa Nacional de Desenvolvimento do Turismo (PRODETUR-RJ) lançado pelo estado do Rio de Janeiro em 2011 teve como objetivo “contribuir para o aumento de emprego e de renda gerados pelo setor do turismo”, através da “interiorização do turismo em direção ao Polo Serra” e da “melhoria do perfil de demanda turística internacional, em especial no Polo Litoral” (RIO DE JANEIRO, 2012, p. 12). Dessa forma, as ações para o desenvolvimento do turismo no Rio de Janeiro foram divididas em dois territórios, o Polo Serra e o Polo Litoral. O Polo Serra é constituído pelas regiões Serra Verde Imperial, Agulhas Negras e Vale do Café, e o Polo Litoral pelas regiões Metropolitana, Costa Verde e Costa do Sol. Os polos representam os principais municípios das seis regiões turísticas estratégicas que estão no Plano Diretor de Turismo (2001).

Como referência para a implantação do PRODETUR no Rio de Janeiro foram utilizadas as orientações e diagnósticos disponíveis no documento Plano de Desenvolvimento Integrado do Turismo Sustentável (PDITS) para organizar as ações destinadas aos municípios fluminenses integrantes do programa. O governo federal, através do PRODETUR nacional destinou R$187 milhões para ações do programa no estado do Rio de Janeiro que se distribuem em atividades específicas para alguns municípios, como ações de infraestrutura ou recuperação de patrimônio arquitetônico local, ou ações comuns entre vários municípios participantes, que são direcionados por seis vetores: investimento (em infraestrutura e urbanização), ações de comercialização (marketing), fortalecimento institucional (das secretarias), proteção ambiental/patrimônio, criação de produtos turísticos e assessoria técnica (RIO DE JANEIRO, 2015).

O PDITS orientou as intervenções destinadas ao estado através dos investimentos, enquanto o “Manual de Operações do Programa Nacional de Desenvolvimento do Turismo  – Rio de Janeiro” serviu para operacionalizar a execução das ações do PRODETUR, sendo então implementadas pela Unidade Coordenadora do Programa (UCP). O manual de operações do PRODETUR-RJ estabeleceu os termos, condições e procedimentos que regem a preparação, a execução dos projetos e atividades do programa que devem estar em consonância com as demais normas que constituem o Regulamento Operacional do Programa (ROP), este último descreve de forma mais geral as ações que devem ser efetivadas para colocar em prática o PRODETUR-RJ (RIO DE JANEIRO, 2012). 

As ações do PRODETUR-RJ foram iniciadas após agosto de 2011 com a previsão de se encerrarem em 2015. A primeira ação foi finalizada em 2014, com a pavimentação da estrada de 5,3 km que serve de acesso entre Visconde de Mauá e a Vila de Maromba e Maringá, em Itatiaia. Outras poucas obras e reformas foram entregues, mas há muito por fazer ou finalizar, já que muitas ações ainda estão no papel (em junho de 2015, por exemplo, ainda estavam sendo abertos processos licitatórios para obras de infraestrutura em Petrópolis e de urbanização e reforma em Paraty). Importante mencionar que a execução da política PRODETUR é de responsabilidade do governo estadual do Rio de Janeiro, representado pela Secretaria de Estado de Turismo (SETUR). Os órgãos diretamente envolvidos na gestão do programa são a Unidade de Coordenação do PRODETUR Nacional (UCP) e a Empresa Consultora de Apoio ao Gerenciamento do Programa  – Consórcio Sondotécnica, Quanta, Engevix – SQE (RIO DE JANEIRO, 2015). 

Vale destacar que de acordo com o website da SETUR, desde 2010, o setor conta com a gestão de duas repartições públicas: a SETUR e a TurisRio. Foi através do Decreto nº 42.777 de 30 de dezembro de 2010 que a SETUR foi instituída, com o objetivo de promover as atividades de turismo de acordo com o Plano Diretor de Turismo. Dentre suas atribuições estão a formulação de políticas de incentivo ao desenvolvimento do turismo fluminense, promoção de produtos turísticos e estímulos aos investimentos no setor, que são atribuições muito semelhantes às da TurisRio.

Além das políticas e ações até aqui mencionadas, ações mais recentes foram implantadas, estimulando o desenvolvimento do setor de turismo no estado fluminense, todas sob a gestão da TurisRio e depois de 2010, com a atuação conjunta da SETUR. São elas: Inventário de Oferta Turística, a nova regionalização, o Rio+3 e o Tour da Experiência.

• Inventário da Oferta Turística (IOT)

O IOT do estado do Rio de Janeiro já tinha sido proposto anteriormente, na década de 1980, levantado pela TurisRio em parceria com os municípios. No ano de 2007 a ação retorna, após a implantação do PNR, desta vez com parcerias do Ministério do Turismo, municípios, conselhos, trade turístico, faculdades de turismo e SEBRAE-RJ. Recentemente foi iniciado um novo trabalho para inventariar 23 cidades do estado no ano de 2015, através da parceria entre o governo estadual e a Universidade Federal Fluminense (UFF). O início das pesquisas foi em março de 2015 com prazo para finalização em até oito meses. É uma ação prevista pelo PRODETUR-RJ, de realização da SETUR com a responsabilidade técnica da Faculdade de Turismo e Hotelaria da UFF, que recebeu financiamento de cerca de R$1,4 milhão do BID. Para produção do inventário, 100 profissionais estão envolvidos, entre professores, estudantes e pesquisadores, nas áreas de Turismo, Estatística, Geografia, Economia e Administração (TURISRIO, 2016a). As 23 cidades que serão inventariadas pertencem às seis regiões turísticas, que sempre foram prioridades das políticas e ações do estado. As regiões contidas na proposta com suas respectivas cidades integrantes são: Agulhas Negras (Itatiaia e Resende); Vale do Café (Vassouras, Valença, Rio das Flores e Barra do Piraí); Metropolitana (Rio de Janeiro e Niterói); Costa do Sol (Cabo Frio, Armação de Búzios, Arraial do Cabo, São Pedro da Aldeia, Iguaba Grande, Araruama e Casimiro de Abreu); Costa Verde (Angra dos Reis, Paraty, Mangaratiba e Rio Claro); e Serra Verde Imperial (Petrópolis, Teresópolis, Nova Friburgo e Cachoeira de Macacu) (TURISRIO, 2016a). Os destinos que realizam seu inventário da oferta turística atualizam a listagem de todo seu equipamento turístico, tais como seus produtos, serviços, artesãos, estabelecimentos, monumentos etc. No inventário há reconhecimento de atrativos turísticos e avaliações sobre condições de infraestrutura e de acesso para uso dos produtos e serviços turísticos. O IOT é uma importante ferramenta para a construção e destinação de políticas e ações para o desenvolvimento das cidades e regiões turísticas, além de elemento fundamental para o planejamento e gestão eficiente.

• Mapeamento das regiões turísticas

Após o processo de regionalização turística do estado fluminense, oficializada pelo Plano Diretor de Turismo (2001), novas discussões foram realizadas em torno da divisão, na medida em que as treze regiões a serem trabalhadas apresentaram uma série de dificuldades, tanto no atendimento de demandas voltadas aos equipamentos e serviços quanto às potencialidades das diferentes atrações turísticas. Com isso, um processo de revisão da regionalização turística foi organizado em 2005, não somente pelo estado do Rio de Janeiro, mas também em todo país, principalmente por conta do PRT implantado pelo Ministério do Turismo em 2004. Desta forma, um novo mapa foi elaborado para ordenar ações de turismo no estado, que seguia as sugestões do Fórum Estadual dos Secretários Municipais de Turismo, que orientava a transformação das 13 regiões turísticas em 11 regiões: Costa verde, Agulhas Negras, Vale do Café, Baixada Fluminense, Metropolitana, Região dos Lagos-Costa do Sol, Caminhos da Mata, Serra Verde Imperial, Serra Norte, Costa Doce, Noroeste das Águas. Nesta atual configuração turística, seis regiões receberam destaque quanto ao seu potencial de desenvolvimento do turismo: Costa Verde, Agulhas Negras, Vale do Café, Região Metropolitana, Serra Verde Imperial e Costa do Sol (TURISRIO, 2016b). Assim como houve uma reavaliação das regiões turísticas, ocorreu também uma nova reconfiguração para as regiões estratégicas, que seriam as ADEs citadas inicialmente pelo Plano Diretor de Turismo. Anteriormente o estado orientava suas ações para oito regiões estratégicas; atualmente são destacadas seis ADEs dentro das onze regiões. A reconfiguração turística do território fluminense significou novas linhas de ações para o desenvolvimento do turismo no interior do estado, reforçando as políticas nestas seis regiões: Costa Verde, Vale do Café, Agulhas Negras, Metropolitana, Costa do Sol e Serra Verde Imperial (TURISRIO, 2016b).

• Rio+3 

O Rio+3 é uma campanha de promoção do turismo do interior fluminense em forma de guia turístico. O documento de 98 páginas inclui programações envolvendo cultura, história, gastronomia e calendário de eventos. Trata-se de uma das ações mais recentes, criada no governo de Luiz Fernando Pezão, organizada pelos trabalhos da SETUR e pela TurisRio. O Rio+3 é uma campanha que apresenta roteiros turísticos no interior do estado ou no litoral em até três horas de viagem o que caracteriza a denominação “Rio+3”. O guia impresso foi distribuído gratuitamente em estabelecimentos que participam do roteiro, incluindo a capital do estado, que é apresentada como ponto inicial dos vários roteiros indicados pelo encarte e também pode ser acessado via internet através dos sites das duas organizações criadoras da campanha. Foram organizados seis roteiros de atrações interioranas de curta distância, o que facilita ao visitante que não queira ou não possa pernoitar nos destinos visitados, já que os destinos estão próximos como a campanha divulga, em relação à capital, no máximo a três horas de distância (RIO DE JANEIRO, 2016). O guia apresenta a programação cultural dos roteiros e a indicação de como chegar aos destinos, incluindo as distâncias de cada um até a capital. Constata-se que a Rio+3 é mais uma campanha de divulgação e roteirização dos destinos do interior fluminense. Assim como outras, é o tipo de ação mais comum realizado pelos governos estaduais, mas que não é suficiente para desenvolver o turismo no estado do Rio de Janeiro.

• O Tour da Experiência

O Projeto Economia da Experiência é uma ação do Ministério do Turismo que envolve parceiros como o SEBRAE nacional e o IMB para a sua implantação. O primeiro destino turístico do estado do Rio de Janeiro trabalhado pela proposta da Economia da Experiência foi a cidade de Petrópolis, na região serrana do estado. As ações desenvolvidas diretamente pelo SEBRAE-RJ em Petrópolis seguiram a metodologia do “Projeto Economia da Experiência: continuidade e abrangência de novos destinos”, desenvolvido entre os anos de 2008 e 2009 (SEBRAE, 2016). O Tour da Experiência “Caminhos do Brasil Imperial” foi a continuação do projeto iniciado em Petrópolis e consistiu numa proposta de valorização de práticas turísticas em destinos que de alguma forma podem ser relacionados ao período imperial. Para desenvolvimento do projeto nas dez cidades envolvidas foram realizadas oficinas de capacitação, consultorias nas micro e pequenas empresas destas cidades, visitas técnicas de aprendizado em “boas práticas” na Serra Gaúcha, formação de preço, redes e canais de divulgação digital, encontro de negócios e participação em feiras e eventos. As capacitações ministradas pelo SEBRAE-RJ entre os empresários foram no sentido de gerar conhecimento em relação ao mercado de turismo, com oficinas de inteligência de mercado, além da roteirização de produtos e serviços, para venda de produtos a partir do roteiro integrado histórico-cultural diferenciado (SETUR, 2013). Nos dois anos (2014 e 2015) de desenvolvimento do projeto “Caminhos do Brasil Imperial”, participaram 118 micro e pequenas empresas da cadeia produtiva do turismo, sediadas nos municípios do Rio de Janeiro, Petrópolis, Teresópolis, Nova Friburgo, Paraty, Visconde de Mauá e Vale do Café (Piraí, Barra do Piraí, Rio das Flores, Valença e Vassouras). Destas, 113 empresas conseguiram desenvolver produtos de experiência turística com identidade própria do Brasil Imperial, sendo estas certificadas com o Selo “Tour da Experiência Caminhos do Brasil Imperial”, a partir de critérios estabelecidos pelo SEBRAE-RJ para oferta de produtos ao mercado turístico com a marca Tour da Experiência (SEBRAE, 2016). Destas ações mais recentes que foram implantadas para o desenvolvimento do turismo no interior fluminense, verifica-se que faltam ações e políticas mais amplas, que considerem toda a complexidade da atividade turística, como infraestrutura de acesso, infraestrutura local básica, profissionais capacitados, entre outras necessidades ao incremento do setor. 

5. Considerações finais

Antes da fusão dos estados, a administração estadual voltada para o turismo restringia-se à FLUMITUR, que efetivamente assessorava os poucos destinos turísticos que se estabeleceram independente da atuação do estado. A cidade do Rio de Janeiro concentrava as principais atividades do setor e a partir dela formou-se a rede estadual após a fusão dos estados. Paralelo ao crescimento das atividades e do aumento dos destinos, os primeiros governos estaduais buscaram, ainda que timidamente, organizar as atividades do setor, formando um arquipélago de destinos sem articulação entre si, apenas com a capital. Ao longo da década de 1990, os governos estaduais buscaram conciliar as demandas do crescimento do setor com a aplicação dos programas criados na esfera federal. Na gestão de Chagas Freitas houve a primeira ação institucionalizada oficialmente para regionalizar e organizar os municípios segundo perfil turístico, e as denominações criadas se popularizaram, sendo atualmente ainda utilizadas.

O Plano Nacional de Turismo constituído em 1992 significou uma nova forma de pensar o setor, já que as diretrizes não mais se centravam no controle ou no incentivo puramente econômico das atividades, como eram até então as políticas de turismo; as novas orientações buscaram potencializar o desenvolvimento social nos destinos. O plano estadual foi elaborado em 2001 em outro contexto, não como versão estadual do plano nacional, mas como resultado das dinâmicas produzidas pela implantação de diferentes programas nacionais e estaduais, tais como o PNMT, o PRODETUR, e a campanha “Cidades Maravilhosas do Estado do Rio de Janeiro”, respectivamente das esferas federal e estadual.

Pela ótica das políticas públicas do setor, o ordenamento das atividades turísticas no território fluminense está ocorrendo de forma fragmentada e dispersa, não só pela centralidade da cidade do Rio de Janeiro na captação dos recursos, mas pela forma como ao longo do tempo pensou-se essa interiorização. Uma das formas de sair desta dependência foi a regionalização das atividades através dos perfis, mas, ainda assim, ações como Rio+3 reforçam a vinculação com a capital e não entre as regiões.

Outro fator de dispersão é a existência de repartições públicas que têm o mesmo campo de atuação competindo entre si, como no caso da TURISRIO e da SETUR. As ações implantadas no estado, frutos das políticas federais, que delegaram ao estado e aos municípios a consecução das políticas, explicitaram antigos problemas: falta de controle sobre o uso do recurso federal e a falta de pessoal qualificado, fazendo que programas como o PRODETUR-RJ ou o projeto “Economia da Experiência” não cumpram os objetivos voltados ao desenvolvimento social, reforçando apenas os de crescimento econômico do setor.

Quanto à formação de regiões turísticas como leitura de instrumento de desenvolvimento, elas na prática reproduzem antigas regionalizações, aliás, voltando-se, grosso modo, àquela proposta pela gestão Chagas Freitas. A utilização de critérios diferentes ao longo do tempo produz configurações que se sobrepõem, tais como polos (serra/litoral), regiões (13 ou 11) ou ADEs (8 ou 6), que na prática reforçam sempre os principais destinos e não permitem que o instrumento viabilize o desenvolvimento de novas cidades.

De forma prática, a regionalização do estado do Rio de Janeiro reconfigurou processos de desenvolvimento do turismo fluminense como a organização territorial, as novas formas de gestão da atividade turística e de articulação entre municípios e estado. Faltam estudos sobre os impactos dos megaeventos ocorridos na capital sobre os demais destinos turísticos no estado, mas não há como negar que as políticas, tais como PNT ou PNMT, influenciaram a constituição de um olhar sobre o setor do turismo, e que o estado, apesar das dificuldades, soube efetivar uma prática, através da TURISRIO e da SETUR, que ao fim e ao cabo, oficializaram perfis de destino e com isto potencializaram uma regionalização das atividades de turismo no estado do Rio de Janeiro.

Para finalizar, é relevante destacar que o Plano Diretor de Turismo do estado foi uma ação importante, mesmo sendo tardio, pois estabeleceu diretrizes e ordenou a atividade turística fluminense. Entretanto, no momento já se encontra defasado precisando de revisão e aprimoramentos para acompanhar a evolução da área, e isto se justifica por conta da própria divisão das regiões e criação das áreas estratégicas realizadas pelo Plano Diretor de Turismo já não serem mais utilizadas. Cabe ao governo estadual mais do que a divulgação das cidades turísticas do interior fluminense, a responsabilidade quanto aos processos de elaboração e execução de ações mais abrangentes e eficientes ao desenvolvimento do turismo no interior do estado do Rio de Janeiro.

Notas

1 O IMB criado em 2002 é uma associação civil de direito privado, sem fins lucrativos, sua atuação está voltada para elaboração, gestão e execução de pesquisas e projetos inovadores e sustentáveis para o desenvolvimento dos segmentos de turismo, cultura e social (IMB, 2015). Nesse processo de intervenção pelo Projeto Economia da Experiência, o IMB elaborou a marca Tour da Experiência, participou do gerenciamento das atividades e elaborou materiais em parceria com o SEBRAE para o Ministério do Turismo, tais como: Cartilha Completa Projeto Economia da Experiência; Estudo de Caso Tour da Experiência; Manual de Adesão; Manual de Conceituação; Manual de Metodologia. 

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