Editorial da Edição
Editorial (volume 2, número 2, ano 2015)
O atual número da RPPR traz dez contribuições sobre três grandes blocos temáticos.
Um primeiro bloco dedica-se a uma discussão a respeito da relação entre política e território; como a política “produz” – ou não – o território. Os três artigos aqui reunidos mostram como a política se expressa em diferentes ações e através de diferentes agentes como aqueles envolvidos no planejamento e ligados ao Estado, por meio da influência de interesses políticos e de seus discursos (hegemônicos) que constroem um território (região) e dos discursos de uma política formulada durante um determinado governo (2003-2010) e de sua (relativa) ineficácia de propiciar uma correspondente intervenção no território.
Assim, destacam diferentes formatos, agentes e escalas de atuação que nem sempre são bem sucedidos em contribuir para mudanças no território.
O primeiro trabalho, de Reinaldo Onofre dos Santos, sob o título Agentes, fatores e escalas do planejamento territorial traz um debate encontrado na bibliografia acerca do papel do Estado na produção do espaço e a derivação do Governo dos aparatos estatais. Procura mostrar como, diante da busca por resoluções de problemas políticos originados em interesses parcialmente contraditórios, da presença de ideologias diversas de partidos que constituem um governo e de outros fatores, são constituídas articulações interurbanas que pretendem promover a competitividade das cidades dentro da perspectiva de um planejamento voltado ao mercado.
O seguinte artigo sobre Contornos de uma história periférica: digressão sobre cultura e política no Nordeste do Brasil de José Luciano Albino Barbosa apresenta uma reflexão sobre o Nordeste brasileiro enquanto uma região que resulta de processos políticos. Lançando mão de uma leitura de três autores que contribuíram para a (des)construção de determinadas apreensões deste “Nordeste” e das mudanças que ocorreram no início dos anos 2000, o autor se pergunta se ainda é possível falar em Nordeste, se faz sentido compreendê-lo como região. E chega à conclusão que sim quando a referência não é meramente a base territorial, mas as posturas e interesses políticos que se aglutinam nele.
Na última contribuição deste bloco, Vitarque Lucas Paes Coelho analisa a A política regional do governo Lula (2003-2010) e procura explicar as razões do fraco desempenho da Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR) conduzida pelo governo Lula entre 2003 e 2010. Uma das falhas para o enfrentamento das desigualdades regionais do país, o autor atribui ao fato de que o avanço retórico e normativo da questão regional não foi acompanhado por uma evolução dos meios concretos de intervenção nesse domínio e de instrumentos concretos. Levanta ainda a premissa que para uma PNDR ser bem sucedida não se poderia prescindir de uma política nacional de desenvolvimento econômico e social.
O segundo bloco do atual número volta-se à temática de formatos político-institucionais e sociais que procuram dar conta de reordenamentos do território por processos econômicos e, especialmente, por grandes projetos de investimento.
Mesmo de uma forma diferente à anterior, nos quatro artigos que compõem este grupo se prolonga a discussão sobre a relação entre política, território e desenvolvimento. No caso, os debates estão voltados mais especificamente a aspectos de mudanças econômicas que prejudicam, de alguma forma, o desenvolvimento regional e a implicações de grandes projetos nas populações que habitam nos territórios por eles transformados.
Há três textos que abordam casos no Estado do Rio de Janeiro. São dois artigos com temáticas sobre a implantação de grandes projetos de investimento. Paulo Pereira Gusmão e Gabriel Barbosa dedicam sua discussão à construção de fóruns de governança territorial na parte leste da região metropolitana do Rio de Janeiro sob o título Governança e desenvolvimento territorial: Limites e possibilidades dos novos arranjos político-institucionais por ocasião da implantação de um polo petroquímico na região metropolitana do Rio de Janeiro. O seguinte texto sobre Territórios em Disputa: resistência e luta no processo de implantação do Complexo Industrial Superporto do Açu dos autores Fellipe Prado e Betty Nogueira Rocha analisa um empreendimento de grande porte no Norte do Estado do Rio de Janeiro no município de São João da Barra. O enfoque está voltado aos desdobramentos da implantação do Superporto do Açu na ótica dos agricultores familiares num dos distritos daquele município e a resistência organizada através da Associação dos Proprietários Rurais e de Imóveis, criada para este fim.
Um último dos textos com referência ao Estado do Rio de Janeiro está voltado para uma região específica, a região serrana, onde examina três aspectos como expressado no seu próprio título A atual região serrana fluminense e seus espaços – economias perdedoras, institucionalidades desarticuladas e realidades sociais perversas. Os autores Daniel de Oliveira Costa e Jorge Alves Natal, após constatarem os problemas dessa região, dedicam sua reflexão ao contexto estadual no qual a região está inserida e aos lugares dos trabalhadores diante de um quadro econômico, político e social preocupante.
Com uma abordagem diferente, o quarto artigo deste bloco toma como seu objeto de análise o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – BNDES – como um dos instrumentos de implementação territorial de determinadas políticas através do seu apoio financeiro aos grandes projetos de geração de energia. Luís Fernando Novoa Garzon sob o título Política Socioambiental e de Entorno do BNDES: dos ajustes espaciais aos corretivos territoriais – os casos das UHEs de Santo Antônio e Jirau (RO) e da UHE de Belo Monte (PA) apresenta posição e discurso paradoxais dessa política socioambiental implícita do banco que são investigados em relação à sua atuação em relação aos grandes complexos hidroelétricos do Rio Madeira e de Belo Monte.
O terceiro bloco, composto por artigos com temáticas mais diversas, está voltado a questões regionais no Brasil e a uma experiência de organização territorial na Colômbia.
Os primeiros dois estudos estão discutindo questões em dois territórios localizados tendencialmente na parte Norte/Nordeste do Brasil. O texto de Andrea Carla de Azevedo com o título Verso e Reverso das Políticas Públicas de Água para o Semiárido Brasileiro se refere a uma problemática de muitas décadas e em uma região de amplo conhecimento – o semiárido brasileiro – onde analisa, criticamente, a natureza de políticas públicas voltadas ao enfrentamento da escassez hídrica através de dois programas recentes específicos. Já o segundo com o título Aspectos da agricultura subdesenvolvida como crítica à tese da última fronteira: estudo sobre o Matopiba de Evaldo Gomes Junior tem como objetivo mostrar as fragilidades de uma regionalização (Maranhão – Tocantins – Piauí – Bahia) que foi promovida pela política federal como uma das maiores fronteiras agrícolas do mundo contemporâneo cuja expansão está baseada em tecnologias modernas de alta produtividade. Procura oferecer uma proposta de regionalização que permitiria um entendimento mais adequado da expansão da agropecuária no país.
O último texto do presente número da RPPR foi escrito por Oscar Alfredo Alfonso Roa e discute La fragmentação territorial inducida por el centralismo fiscal, Colombia 1984-2013. Levanta uma problemática que também é de grande interesse no Brasil: a questão do federalismo fiscal e a centralização/descentralização dos gastos públicos e de sua arrecadação. Procura responder questões a respeito da eficácia de reformas da descentralização fiscal e do avanço da igualdade territorial na provisão de bens públicos. Com relação ao universo da sua investigação, a Colômbia, chega à conclusão que, paradoxalmente, antes da realização de programas de descentralização o país era fiscalmente mais descentralizado.
Rainer Randolph
Hermes Magalhães Tavares
Editores