A estrutura burocrática e a relação com a elevação do Ranking Nacional de Transparência em municípios do Rio Grande do Sul


Suélen Zanotelli
Doutora em Políticas Públicas pela UFRGS. Professora de Contabilidade na Faculdade da Serra Gaúcha

André Luiz Marenco dos Santos
Doutor em Ciência Política da UFRGS; Professor do Departamento de Ciência Política e do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da UFRGS

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[1] É “um movimento global com uma mesma visão: um mundo em que governos, empresas e o cotidiano das pessoas estejam livres da corrupção. Mas nossa luta contra a corrupção não é e nunca será um fim em si mesmo. É uma luta por justiça social, realização de direitos e paz” conforme seu site https://transparenciainternacional.org.br/quem-somos/sobre-a-ti/

[2] Projeto detalhado do Ranking Nacional de Transparência e das datas em que os entes foram notificados das pendências e prazos para regularização, disponível em http://combateacorrupcao.mpf.mp.br/ranking/mapa-da-transparencia/ranking/o-projeto-new . 

[3] Site do MPF o qual informa os critérios que compõem a nota do RNT, disponível em http://combateacorrupcao.mpf.mp.br/ranking/mapa-da-transparencia/ranking/itens-avaliados.Acesso em: 13 ago. 2016.

 

1. Introdução

            A transparência pode ser considerada um elemento essencial nas democracias, pois dá acesso à sociedade ao conhecimento, análise e avaliação da ação de governos e agentes públicos (POSSAMAI e SCHINDLER, 2017. p. 1). No entanto, os temas da relação entre transparência, capacidade estatal e burocracia têm instigado aprofundamento dos estudos, especialmente no que se refere aos controles democráticos sobre a burocracia, a despeito de sua importância para a compreensão de questões atuais como qualidade e eficiência da gestão pública, responsabilização dos governantes perante a sociedade e democratização do Estado (OLIVEIRA, 2010. p. 2). 

Baseando-se nisso, o presente estudo busca testar se a estrutura burocrática, analisada a partir da profissionalização dos servidores, influencia a transparência dos municípios. A transparência será demonstrada através do uso do Ranking Nacional de transparência (RNT), coordenado pelo Ministério Público Federal (MPF). Essa é uma forma de demonstrar o cumprimento das obrigações dos municípios em prestar contas à sociedade a respeito de suas ações e dos recursos que estão operando.

O atual trabalho emprega referências analíticas comuns num estudo de Marenco, Strohschoen e Joner (2017), onde tratam, de forma restrita, a noção de “capacidades estatais”. Essa escolha decorre da determinação em analisar, como objeto, os efeitos associados às capacidades estatais nos governos municipais. Essa capacidade será observada em relação à sua profissionalização a seus impactos na implementação de políticas públicas de transparência. 

Conforme Grin (2012) em relação à burocracia, trabalhar com variáveis de profissionalização permite fornecer contribuições a ampliar o poder de agência governamental. Para isso, na atual discussão serão distinguidos, por um lado, recursos e mecanismos geradores de capacidades estatais como graus de profissionalização de burocracias governamentais e, por outro, efeitos produzidos por sua disponibilidade, sob a forma de implementação de políticas públicas, neste caso, de transparência. 

            Diante de um cenário atual de casos de corrupção no Brasil, de mau uso do dinheiro público e da má distribuição de recursos entre os órgãos, faz-se necessário conhecer como cada um desses órgãos fornece informações sobre sua atuação e uso de recursos como prestação de contas à sociedade. Mais necessário ainda, se se leva em consideração que, conforme Oliver (2010), os cientistas sociais brasileiros sobre a burocracia estiveram sempre focados na construção do Estado, e não nas condições de democratização da administração pública e na responsabilização dos dirigentes políticos. Dessa forma, há uma lacuna de estudos acadêmicos em relação à burocracia que precisa ser preenchida. 

Em pesquisas referentes a transparência em instituições públicas destaca-se a análise explorativa e comparatória de Da Ros (2015) para demonstrar o custo do Poder Judiciário no Brasil. Por sua vez, Vettorazzo (2014), em relação a uma pesquisa da FGV sobre a Lei de Acesso à Informação ao Senado, mostrou que apenas 66% das solicitações retornaram, dirigidas a um conjunto de Câmara dos Deputados, assembleias e câmaras municipais. Cruz et al (2012) buscaram verificar o nível de transparência das informações acerca da gestão pública divulgadas nos portais eletrônicos de 96 dos 100 municípios mais populosos do Brasil. Identificaram que determinadas características e indicadores socioeconômicos dos municípios podem contribuir para explicar o nível de transparência da gestão pública observado. 

O nível de transparência foi verificado através do Índice de Transparência da Gestão Pública Municipal (ITGP-M), que se baseia em códigos internacionais de boas práticas de transparência e governança que podem ser aplicados na legislação brasileira e em experiências de pesquisas anteriores de natureza semelhante realizadas no Brasil e no exterior. Os autores constataram, que existe uma associação, nos sites dos grandes municípios brasileiros que compõem a amostra de seu estudo, entre as condições socioeconômicas dos municípios e os níveis de transparência na divulgação de informações acerca da gestão pública observados. Porém, essas evidências empíricas apontaram para baixos níveis de transparência que poderiam ser considerados incompatíveis com o nível de desenvolvimento socioeconômico dos municípios.

Por sua vez, o Índice de Percepções de Corrupção (IPC) da Transparência Internacional (TI)[1] foi usado por Sodré (2014) para analisar os impactos da corrupção no desenvolvimento humano, desigualdade de renda e pobreza dos municípios brasileiros. Conforme o autor, este índice é elaborado a partir de diversos outros indicadores que são baseados em pesquisas feitas por órgãos espalhados pelo mundo, onde pessoas expressam sua percepção (opinião) sobre o nível de corrupção de determinado lugar. O índice da TI varia em uma escala de 0 a 10, onde zero representa o maior nível de corrupção existente e dez o menor nível. Em seguida é criado um ranking entre os países baseado neste indicador. Os resultados destes rankings mostram, conforme Sodré (2014), que irregularidades praticadas pelos municípios diminuem em 4;5% o IDH-M, aumentam em 6;5% a concentração de renda dos municípios, elevam em 5% a proporção de pobres cuja renda média diminui em 7%. 

No entanto no Brasil, não há nenhum estudo ainda com relação ao RNT e a essas variáveis escolhidas, aplicadas e medidas através das variações das notas que explique o motivo de diferenças de divulgação de informações. Na verdade, não existe no país, mas mesmo essa pesquisa irá focar no estado do Rio Grande do Sul S por causa de limitações posteriormente salientadas. 

Dessa forma, justifica-se o estudo de um viés da burocracia, como causa possível das diferenças de transparência entre municípios, tendo em vista que até o momento não foram analisados desta forma, com a amostra escolhida. Essa pesquisa trará maior ênfase na importância da transparência na gestão pública, que foi um dos focos de trabalho do governo federal e resultou na criação do índice que será analisado. 

Ao definir como variável a burocracia e, neste caso, especificamente a burocracia profissional, será possível testar se e como esta afeta a transparência dos municípios. Com isso, aumenta a instrumentalização do controle social e accountability, que são quesitos basilares da transparência, e preenche uma lacuna conceitual ainda aberta nas variáveis comumente utilizadas.

Nesse sentido, o presente artigo tem como objeto, em municípios do Estado do Rio Grande do Sul (RS) que obtiveram variação acima de 200%, a estrutura burocrática e as características referentes à burocratização, formas de organização e à profissionalização dos servidores.  O objetivo é identificar como o conhecimento desses servidores sobre o ranking influenciou o resultado apresentado quanto às notas da primeira e da segunda avaliação do RNT.

2. Burocracia, Capacidade Estatal e Transparência

            Para embasar a metodologia escolhida, convém ressaltar pressupostos basilares de temas como burocracia, capacidade estatal e transparência, aplicados nessa pesquisa.

2.1 Burocracia

                       Primeiramente, convém salientar que o conceito utilizado é o de Weber (1999) que apresenta as seguintes características de burocracia:

princípio das competências fixas (distribuição fixa das atividades necessárias para a realização dos deveres oficiais, distribuição fixa dos poderes de mando e dos meios coativos, criação de providências planejadas e contratação de pessoas qualificadas segundo critérios gerais); princípio da hierarquia de cargos; documentação dos atos e decisões; especialização das tarefas; profissionalização da força de trabalho dos funcionários (o trabalho na organização burocrática é a ocupação principal dos funcionários e não uma ocupação amadora ou diletante); administração de acordo com regras.” (WEBER, 1999, p. 199-200)

Souza (2017) também reforça a teoria weberiana. A autora destaca, ao estudar burocracia brasileira, que mudou o que se identificava como marca característica do sistema burocrático brasileiro, que era o clientelismo e o patrimonialismo. Hoje se destaca a prevalência do universalismo dos procedimentos, com a profissionalização e qualificação da burocracia pela via do concurso público. A autora ressalta, também, que a maior mudança parece ter ocorrido nas instâncias de controle, tanto o fiscal, quanto o relacionado com a observância de regras e procedimentos.

Dentro desse contexto, o trabalho foca na profissionalização da burocracia como fator de incremento da capacidade estatal em implantar políticas públicas, neste caso, de transparência. A escolha dessa variável vai ao encontro dos estudos de Marenco (2017), no qual, ao estudar 5.500 municípios brasileiros, encontrou que maior concentração de estatutários com formação superior no serviço público de um município aumenta as chances para a implementação de um conjunto de políticas públicas urbanas.

Carpenter (2001) agrega à literatura com seu estudo sobre o impacto que os servidores públicos têm na consolidação do interesse público e na performance da burocracia como instituição, constatando-se a associação entre a atuação da força de trabalho e os resultados institucionais. O autor salientou o importante conceito de autonomia dentro do serviço público, que é obtida através de três condições, que são diferenciação, capacitação e reputação. 

Em seguida, convém salientar os estudos que se referem à relação entre burocracia e transparência. Santos (2009) traz o conceito da profissionalização das estruturas de comissionamento como forma de ser menos vulnerável às injunções da política clientelista e como forma de atender melhor aos princípios de eficiência e transparência. Embora o autor pesquisou cargos comissionados e a tese tenha analisado servidores estatutários, há um incremento conceitual à medida em que a profissionalização de um contratado é vista como diferencial com relação à transparência. No entanto, essa autonomia não poderia ser avessa ao controle político do governo e dos legitimamente eleitos. Com isso, foi destacado que a profissionalização é o pressuposto para que as organizações públicas possam ingressar nesse patamar diferenciado, tendo como horizonte o interesse público e a continuidade de suas políticas. 

Filgueiras (2018) conceitua governança, a gestão pública, para além do aspecto gerencial e dos mecanismos de gestão. Para o autor, governança representa um processo de conexão entre os mecanismos de administração com a dimensão política e infra estrutural do poder. Nesse contexto, a autonomia aparece como a capacidade com que as instituições podem realizar ação pública, independente das diretrizes particularistas. Por meio de sua pesquisa sobre por que as reformas administrativas falham, Rezende (2002), destacou que autonomia, responsabilidade e accountability nem sempre são entendidos da mesma forma entre os atores estratégicos e os reformistas. Na medida em que um ajuste fiscal pressupõe um aumento no controle sobre o aparelho burocrático, a mudança institucional pressupõe menos controle como elemento necessário à performance. 

Oliveri (2011) busca testar a relação entre controles políticos democráticos sobre a burocracia. Destacando pressupostos weberianos, como o de que a expansão da burocracia no domínio público é influenciada pela sua superioridade técnica, a autora discute também conceitos de accountability política como uma relação entre um ator ou órgão de controle e um agente público (seja político ou burocrata). Por sua vez, Cavalcante e Carvalho (2017) ressaltam o avanço da profissionalização do serviço público no país como forma de evolução da estrutura burocrática. Conforme os autores, isso se deve ao fato de que a estrutura burocrática, quanto mais autônoma, menores as chances de arbitrariedade e interferência de critérios fisiológicos e particularistas. Para isso, os autores destacam a elevação da escolaridade de cargos na administração pública federal e um processo contínuo de institucionalização do desenvolvimento de competências dos burocratas, especialmente mediante o fortalecimento do papel das escolas de governo. 

Por outro lado, além de considerar a profissionalização como o autor acima citado, Peters (1999) verifica que a cultura administrativa e social acaba por influenciar, orientar e delimitar os horizontes quanto ao comportamento dos funcionários públicos. O autor destaca também que há uma construção de uma cultura específica para cada organização administrativa, que fará uma interpretação própria para as normas jurídicas. Ou seja, é um aspecto que pode justificar o fato de a profissionalização dos servidores não ser impactante nos resultados sobre a transparência. 

O fato de que as organizações estão se tornando mais homogêneas é abordado por Dimaggio e Powell (2005). Dessa forma, a burocratização aparece como resultado de processos que tornam as organizações mais similares, sem, necessariamente, virarem mais eficientes. Os autores também trazem os conceitos de isomorfismos como forma de tornar as organizações mais similares, que são o coercitivo, o mimético e o normativo, como os próprios nomes já sugerem seus conceitos. Já o presente artigo inova, pois pesquisa o que levou os municípios a se destacarem com um elevado aumento de notas no RNT. O que fez com que saísse da tendência do isomorfismo e conquistaram elevado aumento de nota no ranking. 

Em se tratando das carreiras burocráticas, Cruz (2008) discutiu duas formas de organização que é a burocracia organizacional e a burocracia profissional. O tipo organizacional caracteriza-se pela presença de regras que determinam os critérios de nomeação para os cargos mais elevados, como o prévio ingresso no serviço público. Já a burocracia orientada para a profissão caracteriza-se pelo treinamento profissional, não necessariamente relacionado com o exercício de uma função pública, como condição para a nomeação aos altos postos. Em lugar da prevalência das normas organizacionais, o valor da profissão e seu status são considerados suficientes e, mesmo ainda, superiores para definir a nomeação aos cargos diretivos. A autora salienta que no modelo profissionalmente orientado, o corpo de conhecimentos e técnicas é definido por uma associação de profissionais, que determina também os meios pelos quais a informação é transmitida e como deve ser utilizada. Cabe analisarmos, nos casos concretos de elevação de transparência, quais os fatores que condicionaram essa situação, em especial, quais profissões eram responsáveis por essa demanda.

2.2 Capacidade Estatal

Dado o contexto de ascensão e consolidação do campo, estudos em políticas públicas se dedicam a analisar atores, processos e estruturas envolvidos na ação do Estado na busca pelo desenvolvimento.  Diante desse cenário, a discussão sobre a capacidade dos Estados de identificar problemas e formular e implementar políticas se faz essencial (GOMIDE e BOSCHI, 2016). Nesse sentido, o trabalho busca também analisar capacidade estatal em se tratando da estrutura dos municípios em relação à profissionalização local, no que se refere ao impacto sobre políticas públicas de transparência.

O conceito de capacidade estatal nasce do interesse em compreender o papel do estado no desenvolvimento. Por meio de trabalhos científicos, tal conceito adquiriu centralidade durante o final dos anos 70 e 80, e atualmente exerce um papel importante dentro dos estudos de dimensões de governança (CINGOLANI, 2013, p. 3). Através de um relato histórico da evolução e uso do conceito de capacidade estatal, a autora aborda o conceito de como a capacidade estatal afeta os resultados do desenvolvimento, o que pode ser aplicado, no caso, ao desenvolvimento de políticas públicas de transparência.

            Cigolani (2013) coloca que a capacidade estatal se refere a uma ou a uma combinação das seguintes dimensões do poder do Estado: coercitiva; fiscal; administrativa/ implementação; transformadora ou industrializante; territorial; legal; política. O conceito relacionado à capacidade dos municípios em atender a políticas públicas de transparência se relaciona, prioritariamente, com a capacidade administrativa e legal, dentro deste conceito. Outro estudo de Cigolani (2013) aborda os impactos da capacidade do Estado e da autonomia burocrática nas metas de desenvolvimento. Por meio deste foi possível destacar que a eficácia ou capacidade estatal pressupõe a existência de burocracias weberianas profissionais e politicamente isoladas. Essa afirmação ajuda a justificar a escolha da variável independente sendo a relação entre a profissionalização do servidor municipal em relação à quantidade total de funcionários.

            Nessa mesma linha de raciocínio, sem analisar apenas isto, Marenco, Stroschoen e Joner (2017) distinguem recursos e mecanismos geradores de capacidades estatais – como graus de profissionalização de burocracias governamentais – e efeitos produzidos por sua disponibilidade, sob a forma de implementação de políticas públicas.  Ao considerar fatores como tamanho do município, transferências intergovernamentais, preferências ideológicas e custos políticos, concluíram que a profissionalização da burocracia municipal incrementa as chances de arrecadação de imposto patrimonial. Esse estudo vai ao encontro desta tese, que vê a variável profissionalização como uma variável eficiente para responder ao questionamento sobre capacidade de implementação de uma política pública.

            Além destes autores, Pires e Gomide (2016) analisam, comparativamente, programas federais envolvendo temas como governança e capacidades estatais. Investigam de que forma as características desses arranjos condicionaram as capacidades estatais disponíveis e afetaram o desempenho e os resultados até então observados de políticas públicas pré-selecionadas. Verificou-se na pesquisa desses autores que os arranjos institucionais indutores de altas capacidades técnico-administrativas, envolvendo combinação de organizações profissionalizadas com mecanismos efetivos de coordenação intra e intergovernamentais, tendem a promover um melhor desempenho relativo em termos de entrega de resultados. Ou seja, mais um estudo destacando profissionalização com entrega de resultados, o que serve de apoio para as variáveis escolhidas da atual discussão.

            Logo, a partir das teorias mencionadas pode-se entender a capacidade estatal de um município como aquela de contratar e manter servidores qualificados de forma a contribuir na política de transparência. As mencionadas teorias não se limitam a essa variável, mas abordam também essa relação entre capacitação e transparência. 

Neste sentido e dadas as limitações da atual investigação, parece justificável tomar a profissionalização dos servidores como indicador na análise da capacidade estatal em relação à política de transparência cujos resultados são aqui representados pelo RNT.

2.3 Transparência

            Conforme Michenera e Katherine (2009), por muitas vezes o termo transparência é utilizado como equivalente à accountability. O presente trabalho segue a opinião das autoras para as quais a transparência é vista como uma aliada à construção de uma informação de confiança, servindo de apoio à accountability. Ou seja, a transparência é vista como uma variável independente, contra a corrupção e de apoio à democracia.

            Michenera e Katherine (2009) trabalham alguns conceitos fundamentais, tais como: a) transparência para cima (vertical), a qual ocorre quando há relacionamentos hierárquicos como da análise principal-agente que subsidia a maioria dos modelos econômicos; b) transparência para baixo (vertical),  a qual ocorre quando os governados podem observar a conduta, o comportamento e os resultados de seus governantes; c) transparência para fora (horizontal), a qual ocorre quando o subordinado hierárquico consegue observar que está acontecendo além da organização; d) transparência para dentro (horizontal), a qual ocorre quando aqueles que estão de fora da organização conseguem observar aquilo que ocorre em seu interior; e) transparência ativa, entendida como a difusão sistematizada e periódica de informações sobre a gestão estatal; f) transparência passiva, referindo-se à obrigação do Estado em conceder, a todos os cidadãos que requeiram, o acesso tempestivo aos documentos oficiais, salvo aqueles protegidos por motivos de segurança.

            Por fim, cabe destacar a transparência como sendo fundamental para que o cidadão tenha instrumentos de avaliação e, caso sejam constatados inconformidades e descumprimento de suas responsabilidades na gestão de um governante, de punição. (O’DONNELL, 1991; PINHO e SACRAMENTO, 2004). 

            Existem formas de mensurar a transparência através de diferentes índices. Optou-se no presente trabalho pelo RNT devido ao fato deste ser aplicado a todos os municípios do país e se basear na principal legislação brasileira sobre transparência, que é a Lei de Acesso à Informação (LAI). 

2.4 Ranking Nacional de Transparência (RNT) 

O conjunto normativo de leis referentes à transparência no Brasil foi completado com a LAI que disciplinou o pedido de informações tanto no seu aspecto ativo quanto passivo. A primeira avaliação foi realizada em 2015 e a segunda avaliação no ano de 2016, e levam em consideração para realizar o ranking as questões apresentadas no Quadro 1.

Quadro 1. Questões utilizadas para avaliar o RNT nos anos de 2015 e 2016.

Aspectos

Questões

Geral

1 - O ente possui informações sobre Transparência na internet?

2 - O Site contém ferramenta de pesquisa de conteúdo que permita o acesso à informação?

Receita

3 - Há informações sobre a receita nos últimos 6 meses, incluindo natureza, valor de previsão e valor arrecadado?

Despesa

4- As despesas apresentam dados dos últimos 6 meses contendo o valor do empenho, da liquidação, do pagamento e o favorecido?

Licitações e contratos

5 - O site apresenta dados nos últimos 6 meses contendo a íntegra dos editais de licitação; o resultado dos editais de licitação e os contratos na íntegra?

6 - O ente divulga as seguintes informações concernentes a procedimentos licitatórios com dados dos últimos 6 meses: modalidade, data, valor, número/ano do edital, objeto?

Relatórios

7 - O site apresenta as prestações de contas (relatório de gestão) do ano anterior; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária (RREO) dos últimos 6 meses; o Relatório de Gestão Fiscal (RGF) dos últimos 6 meses; o Relatório estatístico contendo a quantidade de pedidos de informação recebidos, atendidos e indeferidos, bem como informações genéricas sobre os solicitantes?

8 - O Site possibilita a gravação de relatórios em diversos formatos eletrônicos, abertos e não proprietários, tais como planilhas e texto (CSV), de modo a facilitar a análise das informações? 

Serviço de informações ao cidadão

9 – Há possibilidade de entrega de um pedido de acesso de forma presencial?

Serviço eletrônico de informações ao cidadão

(e-SIC)

10 - Há possibilidade de envio de pedidos de informação de forma eletrônica (e-SIC)?

11 - Apresenta possibilidade de acompanhamento posterior da solicitação?

12 - A solicitação por meio do e-SIC é simples, ou seja, sem a exigência de itens de identificação do requerente que dificultem ou impossibilitem o acesso à informação, tais como: envio de documentos, assinatura reconhecida, declaração de responsabilidade, maioridade?

Divulgação da estrutura e forma de contato

13 - No site está disponibilizado o registro das competências e estrutura organizacional do ente?

14 - O Portal disponibiliza endereços e telefones das respectivas unidades e horários de atendimento ao público?

Boas práticas de transparência

15 - Há divulgação de remuneração individualizada por nome do agente público?

16 - Há divulgação de Diárias e passagens por nome de favorecido e constando, data, destino, cargo e motivo da viagem?

Fonte: Elaborado pelos autores a partir do site do MPF.

Desta forma, a escala decorrente das avaliações desses quesitos também gera um resultado de zero a 10, assim como a EBT. O RNT em 2015 e 2016 avaliou 5.568 municípios, e chegou a uma nota média geral, chamada de Índice Nacional de Transparência, que proverá uma análise satisfatória de transparência dos municípios do RS.

3. Determinação do universo e investigação da atenção pela transparência nos municípios selecionados

3.1 Mudanças do RNT entre 2015 e 2016 como critério de seleção dos municípios

A amostra da pesquisa partiu da identificação do conjunto de municípios do RS que tiveram aumento superior a 200% entre a primeira e a segunda avaliação do RNT, entre os anos de 2015 e 2016. A escolha dessa variação se deu após uma criteriosa análise da evolução das notas nesses dois levantamentos, conforme apresentado na Figura 1.

Figura 1: Variação das notas dos municípios nas duas avaliações.

Fonte: Figura gerada pelo Excel, elaborada pelos autores.

 

Na Figura 1 nota-se que na primeira avaliação a maioria das notas no ranking constam nos intervalos de 5 a 8. Como já mencionado o intervalo é de 1 a 10; o gráfico gerou automaticamente os números de 10,68 e 10,89 apenas por questão de configuração da divisão dos intervalos. Já na segunda avaliação, tendencialmente, a tendência evoluiu para notas de 6,93 a 9,9. Mostrar essa evolução não traria um retorno esperado tanto quando estudar os outliers, que foram as notas que não seguiram ao padrão dos gráficos apresentados. Para ter uma evolução mínima de 200%, as notas da primeira avaliação deveriam estar abaixo de 3,3, para que somando 200% não ultrapasse 10. A escolha dos dados se deu por essa situação estar fora da maioria dos casos apresentados, o que permitirá mais especificadamente mostrar quais as situações que cada um desses municípios possui que permitiu essa tendência de aumento de notas entre a primeira e a segunda avaliação fora da curva normal. 

A partir de desse critério foram identificados dezoito municípios no Estado: Amaral Ferrador; Aratiba; Barão; Boa Vista das Missões; Bozano; Caminas do Sul; Capitão; Charrua; Estação; Formigueiro; Maçambará; Nova Prata; Paraí; Passa Sete; Quatro Irmãos; Sentinela do Sul; Tororí; Ubiretama. 

Os municípios com aumento superior a 200% entre a primeira e a segunda avaliação do RNT, constam no Quadro 2.

Quadro 2. Municípios do RS que tiveram aumento superior a 200% entre a primeira e a segunda avaliação do RNT, com segunda nota acima de 6.

Município

Nota

1ª Avaliação

Nota

2ª Avaliação

Diferença Percentual

Charrua

1,1

8,6

681,80%

Passa Sete

1,6

9,5

493,80%

Quatro Irmãos

1,4

8,3

492,90%

Toropi

1,7

10

488,20%

Maçambará

1,9

10

426,30%

Ubiretama

1,6

8,1

406,30%

Boa Vista das Missões

1,8

8,1

350,00%

Sentinela do Sul

1,5

6,3

320,00%

Paraí

1,9

7,3

284,20%

Bozano

1,7

6,2

264,70%

Campinas do Sul

2,2

7,9

259,10%

Aratiba

2

7,1

255,00%

Capitão

2,1

7,4

252,40%

Nova Prata

2,7

9,3

244,40%

Formigueiro

3

10

233,30%

Estação

2,4

7,7

220,80%

Amaral Ferrador

2,8

8,8

214,30%

Barão

2,7

8,1

200,00%

Fonte: Elaborado pelos autores, a partir do MPF.

3.2 Dimensões de atenção pela transparência nas prefeituras e seus municípios

A partir das discussões anteriores elaborou-se um questionário voltado para características da transparência que se procurou operacionalizar por meio de 8 perguntas abertas. Este questionário foi enviado a cada um dos dezoito municípios. São essas as perguntas:

Questão 1 – A gestão atual da prefeitura tem conhecimento sobre o que é o Ranking Nacional de Transparência (RNT), e está ciente das notas que receberam nas duas avaliações? O foco dessa pergunta foi verificar a execução informada no RNT sobre as avaliações. Conforme especificado na descrição do projeto[2] do MPF, os entes foram analisados através de um check list de informações que deveriam ser cumpridas e esse checklist gerava uma nota final de 0 a 10 pontos. Conforme o MPF, após a primeira avaliação os participantes foram notificados das pendências para que procedessem a regularização. Cabe a essa pergunta verificar se essa notificação causou impacto no aumento expressivo da nota da segunda avaliação dos municípios analisados, feita em data posterior aos ajustes solicitados após a análise da primeira avaliação.

Questão 2 – Existe um setor da Prefeitura que cuida da transparência das informações no site? A inclusão desse questionamento baseia-se em Weber(1999), no conceito dentro do estudo de burocracia em que o autor cita a divisão de tarefas especializadas aumenta a produtividade. Objetivava-se verificar se a mão de obra voltada ao atendimento da transparência municipal iria justificar melhores resultados e o aumento das notas observadas.

Questão 3 – Qual a denominação do cargo e a formação que as pessoas desse setor possuem? (em caso afirmativo do item 2). Esse questionamento propõe verificar a qualificação profissional dos servidores, que também converge tanto com o conceito de especialização das atividades trazido por Weber (1999) quanto com o estudo de capacidade estatal de Cigolani (2013), no qual verifica a capacidade estatal de organização para atendimento das políticas públicas de transparência. Essa questão também visa salientar se uma determinada formação superior específica indica um impacto na elevação da transparência.  

Questão 4 – Existe por parte da Prefeitura alguma orientação aos servidores sobre como atender as normas de transparência? Enquanto que a questão 3 buscava analisar a qualificação profissional de quem executa tarefas de atendimento à transparência, essa questão 4 analisa como a alta cúpula da gestão das prefeituras analisadas repassam informações a quem deve executar as tarefas. Com isso, consegue-se analisar o tratamento das informações envolvendo o atendimento de transparência de uma forma completa, envolvendo gestão e execução. 

Questão 5 – Existe um esclarecimento da Prefeitura sobre a importância da transparência para a sociedade? Se sim, como esse esclarecimento é feito? (ex. reuniões, cursos, etc.). Esse questionamento extrapola o âmbito da gestão interna e busca verificar como o ente público trata das questões de transparência junto à sociedade. Busca-se verificar se há incentivo por parte da gestão pública para que a sociedade entenda seu papel partitivo e se utilize das informações que são divulgadas. 

Questão 6 – A sociedade de sua cidade cobra informações que não estão disponíveis no site, ou não tem esse costume? Se sim, quais informações já foram cobradas? Considerando-se que a tarefa das organizações governamentais foi efetuada, testa-se o comportamento da sociedade com esse questionamento. Se existe o atendimento da demanda de transparência, almeja-se saber se os cidadãos se utilizam dos canais de contato e das informações disponibilizadas, que seria a efetividade da política pública de transparência implantada.

Questão 7 – Existiu alguma estratégia por parte da Prefeitura, que justificasse um aumento tão elevado de notas da segunda avaliação em relação à primeira? Essa questão se aplica especificadamente ao aumento de nota entre as duas avaliações dos 5 municípios que responderam ao questionário. Se houve algum trabalho de valorização a esse levantamento para o RNT e, se sim, o que foi feito para que fosse conseguida uma elevação tão abrupta de nota.

Questão 8 – Existiu algum impacto no cotidiano dos servidores com relação a esse aumento de nota? (Por exemplo, algum padrão de comportamento novo, algo que não faziam e passaram a fazer, etc.). Para finalizar a análise de todos os envolvidos e verificada implantação, conhecimento pelos servidores do RNT, atuação da sociedade sobre a transparência, finaliza-se o questionamento verificando se essa elevação de nota afetou a atividade interna do ente governamental. Se houve mudança de comportamento das atividades cotidianas, de modo que essa adesão a práticas transparentes superasse o atendimento de uma nota para um ranking e passasse a ser uma nova forma de trabalho. 

4. Relação entre a profissionalização dos servidores responsáveis pela transparência de informação dos municípios do RS e a elevação do RNT?

Dos dezoito questionários enviados houve retornos dos municípios de Antônio Prado, Boa Vista das Missões, Campinas do Sul, Charrua, Estação. As respostas dos questionários foram analisadas a partir de uma abordagem qualitativa, valendo-se da técnica de análise que se apoia em Bardin (2021). Esta autora analisa um conteúdo como o do questionário aplicado por meio de uma técnica de investigação que visa a interpretação das respostas através de uma descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo das comunicações.

Uma síntese das respostas obtidas para as oito perguntas do questionário se encontra no Quadro 3.

Quadro 3. Resultados sintetizados obtidos das prefeituras.

 

Questões

Municípios

1

2

3

4

5

6

7

8

Boa Vista das Missões

Sim

Sim

Direito, Contabilidade e Administração.

Sim

Sim

Não

Sim

Sim

Campinas do Sul

Não

Sim

Contabilidade

e Direito

Sim

Não

Sim

Sim

Não

Charrua

Não

Não

-

Sim

Não

Não

Não

Não

Estação

Não

Sim

Jornalismo

Sim

-

Não

Sim

Sim

Nova Prata

Sim

Sim

Administração

Pública e Direito

Sim

Não

Não

Não

Sim

Fonte: Elaborado pelos autores.

Os retornos sobre a primeira questão (A gestão atual da prefeitura tem conhecimento sobre o que é o Ranking Nacional de Transparência, e está ciente das notas que receberam nas duas avaliações?) revelaram que a maioria dos municípios (3/5) desconhecem esse ranking, e, consequentemente, essa avaliação.

Conforme destacado pelos municípios de Charrua e Estação, até o encaminhamento do questionário os municípios não tinham percepção nem de suas notas, nem do aumento da referida nota entre os anos de 2015 e 2016, conforme fica evidenciado na resposta do município de Charrua: “Até o encaminhamento da presente pesquisa, a gestão não possuía conhecimento acerca do Ranking Nacional de Transparência, tampouco sobre suas notas.” Se, por um lado, o desconhecimento do RNT demonstrou não ser empecilho para que os municípios aumentassem consideravelmente suas notas entre as avaliações, por outro, pôs em questionamento a metodologia de avaliação do MPF, o qual informa que os municípios que foram avaliados na primeira avaliação do RNT receberam retorno e prazo para se adequarem às exigências do ranking. Houve um gargalo entre a metodologia explanada no RNT e o desconhecimento dos responsáveis pelo assunto nos municípios analisados. Espera-se, nas próximas pesquisas, um aprofundamento em questões como: qual cargo nas prefeituras o MPF contata para retornar as avaliações efetuadas? Essa situação nas prefeituras é repassada a toda a equipe? Por que essa informação do ranking e das notas não foi de conhecimento de quem atualmente atende e responde as demandas pertinentes a esse assunto?

            A segunda questão (Existe um setor da Prefeitura que cuida da transparência das informações no site?) teve a intenção de verificar se a organização interna institucional favorece o local ter melhores resultados. Observou-se que 4, entre os 5 municípios, informaram que existe um setor específico dentro da prefeitura que cuida da transparência das informações. Essa organização converge com Weber (1999), o qual reforça a capacitação e a especialização como forma de melhor estruturação da burocracia frente às demandas estatais.

Entre os setores responsáveis pela gestão destacam-se as secretarias de Administração (Antônio Prado e Estação), Procuradoria Jurídica e Controle Interno (Boa Vista das Missões) Contadoria/Setor Contábil e de Tributos (Boa Vista do Sul e Campinas do Sul) e Secretaria de Comunicação (Estação), o que é denota a estreita relação entre o tema da transparência com enfoques contábeis e administrativos. 

            A terceira questão (Qual a denominação do cargo e a formação que as pessoas desse setor possuem?) tem estreita relação com o tema central da presente pesquisa, tendo em vista o objetivo de verificar se os servidores estatutários de nível superior influenciam na transparência. A partir das respostas pode-se observar que em todos os municípios que houve resposta para a presente questão, a gestão da transparência tem participação de servidores estatutários de nível superior.

Nesse aspecto destacam-se a formação em Direito (Antônio Prado, Boa Vista das Missões, Campinas do Sul), Contabilidade (Boa Vista das Missões, Campinas do Sul), Administração (Antônio Prado, Boa Vista das Missões) e Jornalismo (Estação). O perfil da formação dos profissionais de nível superior é revelador da preocupação das questões de legislação, finanças e administração pública, bem como da necessidade de comunicação com a sociedade, no que se refere ao tema da transparência por parte dos municípios. Resultado esperado, apoiado em Carpeter (2001) e Cavalcante e Carvalho (2017), autores que ressaltam o aumento da escolaridade como propulsores de capacidade estatal dos entes governamentais para atendimento de demandas com maior autonomia de trabalho para melhor execução das demandas.

            Na quarta questão (Existe por parte da Prefeitura alguma orientação aos servidores sobre como atender as normas de transparência?) os 5 municípios declararam haver orientação aos servidores para atender as normas de transparência. Nesse aspecto salienta-se a busca por capacitação dos servidores com o auxílio de instituições como a Federação dos Municípios do Estado do Rio Grande do Sul (Famurs) conforme informado pelo município de Campinas do Sul. Outra organização que tem papel determinante para o trabalho realizado nos municípios é o TCE/RS. Conforme destacado pelo município de Estação “a Administração Municipal, em conjunto com a Unidade Central de Controle Interno, buscam trazer cada vez mais informações ao Portal de Transparência, visando sempre atender a legislação e orientações do TCE/RS”.

Cabe salientar que o TCE/RS, como o órgão público que tem por ofício exigir informações sobre transparência por parte dos municípios, pode ser considerado o principal agente influenciador de melhorias na gestão do referido tema por parte das prefeituras. Ou seja, essas prefeituras podem ter aumentado a transparência principalmente devido às exigências do TCE/RS, tendo em vista que foi apresentado em algumas respostas como o principal “influenciador” das melhorias.

Nesse sentido, cabe destaque à Campanha de Transparência que o órgão faz desde 2014 junto às prefeituras. Através do site do TCE/RS, foi possível verificar que o órgão lançou, em maio de 2014, a Campanha permanente chamada “Transparência: faça essa ideia pegar”. A iniciativa teve por objetivo sensibilizar os gestores públicos a divulgarem informações sobre a gestão de recursos governamentais no ambiente virtual, de forma a ampliar as possibilidades de autofiscalização e de controle social. Foram promovidas ações educativas e capacitações, ministradas por servidores do TCE-RS, de aproximadamente 800 professores estaduais de diferentes regiões do Estado do Rio Grande do Sul. Também foram proferidas palestras para além de universitários, estudantes do ensino médio e profissionais de jornalismo. Também foram elaborados e divulgados vídeos institucionais, com a participação voluntária de figuras públicas, que se propuseram a explicar, de maneira prática e acessível, a importância da transparência. Os vídeos foram disponibilizados, a pedido do TCE/RS, nos portais das principais instituições estaduais do Rio Grande do Sul, a exemplo do Ministério Público, da Defensoria Pública e do Tribunal de Justiça. Os times de futebol mais populares do Estado – Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense e Sport Club Internacional – também oportunizaram a inserção dos mencionados vídeos nos telões de seus estádios durante o intervalo de alguns jogos, permitindo expandir o universo de divulgação. Por fim, as produções foram veiculadas na TV Educativa do Estado (TVE-RS) e na TV da Assembleia Legislativa, bem como exibidas nas mais diversas palestras realizadas pelo Tribunal de Contas em Municípios gaúchos e em outros Estados da Federação. Conforme relatório deste programa, disponibilizado no site do TCE/RS, o órgão acredita que, com essa vasta lista de parcerias e de ações, foi possível propagar a cultura da transparência na Administração Pública para os cidadãos gaúchos dos mais distintos lugares e perfis socioeconômicos por meio de vídeos e folders, transmitindo informações objetivas e de fácil entendimento. 

Na quinta questão (Existe um esclarecimento da Prefeitura sobre a importância da transparência para a sociedade? Se sim, como esse esclarecimento é feito?), das quatro prefeituras que responderam à questão, duas informaram que não existe esclarecimento da transparência para a sociedade (Antônio Prado e Campinas do Sul). No caso das respostas afirmativas, as formas de esclarecimentos à sociedade se dão através de audiências públicas (Boa Vista das Missões) e através “postagens nas redes sociais orientando a população acerca da transparência na municipalidade”, conforme informado pela prefeitura de Charrua. O aparecimento de referência às redes sociaisremete às novas dinâmicas de comunicação entre o poder público e a sociedade tendo em vista ao grande potencial de alcance dessa ferramenta. Mesmo a quantidade dos municípios analisada sendo pequena, a pesquisa retornou que a metade deles respondeu que a prefeitura não esclarece a importância da transparência para a sociedade. Isso sugere uma situação que vai de encontro a Filgueras (2018), o qual vê capacidade nas instituições em realizar ação pública. Depreende-se do autor o termo “capacidade” como uma necessidade de iniciativa dessas ações por parte das instituições. Esse esclarecimento para a sociedade deveria ser obrigatório e todos os municípios, com o intuito de incentivar o uso das informações disponíveis por parte da sociedade.

            Na sexta questão (A sociedade de sua cidade cobra informações que não estão disponíveis no site, ou não tem esse costume? Se sim, quais informações já foram cobradas?), em 3 dos 5 retornos, os municípios salientaram nas respostas o termo que consta na pergunta “não tem esse costume” (Antônio Prado, Boa Vista das Missões e Charrua). As referidas respostas demonstram a falta de um comportamento proativo por parte da sociedade em relação ao tema da transparência. 

Destacou-se como exceção a resposta do município de Campinas do Sul “muitos munícipes acompanham o portal e caso não visualizam a atualização semanal já entram em contato”. Essa resposta remete a situações em que parte da população desse município acompanha a divulgação de informações e demonstra comportamento proativo em relação ao tema da transparência, o que pode representar uma tendência de aumento do interesse da população pelo tema. Nessa questão caberiam duas pesquisas de aprofundamento no tema. A primeira se refere aos motivos pelos quais não há o hábito de boa parte da população analisada em não se utilizar de informações disponíveis para exercer direitos de cidadão participativo. A segunda é o caso de Campinas do Sul. O que ocorre nesse município que apresenta um comportamento de outlier frente aos demais, no que se refere à participação social e ao uso da transparência fornecida?

Na sétima questão (Existiu alguma estratégia por parte da Prefeitura, que justificasse um aumento tão elevado de notas da segunda avaliação em relação à primeira?) observa-se que os 5 municípios se valeram de ações para melhorar o site da prefeitura visando atender as exigências legais. No caso da prefeitura de Antônio Prado, desde 2014 ocorreram ações para “atender 100% as exigências do portal da transparência”. O município de Boa Vista das Missões informou que houve a “contratação de empresa da Área de Tecnologia” o que possibilitou uma “constante alimentação dos dados via Portal”. Da mesma forma, a prefeitura de Campinas do Sul também contratou uma empresa de “Website” a qual “realizou adequações no software, em cumprimento às exigências legais e do TCE/RS”. O município de Charrua informou que foram “implementadas melhorias, tanto no Portal da Transparência, quanto no site, que cumprem com itens que não eram atendidos em ambas as avaliações”. Por sua vez, o município de Estação que “tendo em vista as análises anuais do TCE/RS, a Administração Municipal, com o auxílio da Unidade Central de Controle Interno, busca atender cada vez mais pontos elencados nas análises, o que vem melhorando as informações prestadas no site do Município”. A partir das informações, é possível perceber que ajustes realizados em apenas uma ferramenta de gestão, o site da prefeitura, garante aos municípios uma alteração substancial em suas notas no RNT, pois as análises principais da nota, conforme o MPF[3], é se o ente possui informações sobre transparência na internet, e se o site contém ferramentas de pesquisa de conteúdo que permita acesso à informação. Dessa forma, ao ser dado foco na divulgação dos resultados nos sítios das prefeituras, consegue-se uma majoração significativa da nota, pois atende ao foco da avaliação.

A oitava questão (Existiu algum impacto no cotidiano dos servidores com relação a esse aumento de nota? Por exemplo, algum padrão de comportamento novo, algo que não faziam e passaram a fazer, etc.) teve como foco observar se as prefeituras analisadas estão apenas cumprindo exigências legais ou se mudou a percepção local por parte dos servidores sobre a necessidade de transparência. Parte das respostas indica que não houve impacto no cotidiano dos servidores como no caso dos municípios de Campinas do Sul (“somente foram adequados procedimentos internos e de software de gestão”) e Charrua (“apenas lançamento de dados no sistema que gera o Portal da Transparência, bem como, no site institucional do município”). Porém também é possível perceber alteração na rotina dos servidores, seja por ajustes na forma de gerir o sistema da transparência (“todos são fiscais da transparência, pegamos por habito observar diariamente o site e quando alguém observa algum problema, relata ao responsável”), como no caso de Antônio Prado, seja para evitar situações indesejáveis perante os órgãos de controle (“A conscientização da necessidade da publicação, e alimentação dos dados não só pelo cumprimento legal, mas pela prestação de contas tão necessárias à aferição pelos órgãos de controle...”), como no caso do município de Boa Vista das Missões,  ou seja pelo fato de diminuição da carga de trabalho dos servidores (“O fato de haver mais informações disponíveis no site do Município e a possibilidade de maior interação por meio dele facilita o trabalho dos servidores, tendo em vista a possibilidade de o cidadão consultar de forma autônoma dados e buscar serviços diretamente no site do município.”), como no caso do município de Estação. Esses retornos obtidos nessa questão vão ao encontro de Peters (1999), o qual traz a cultura administrativa e social como influenciadora do comportamento dos funcionários públicos. Deve-se pensar em uma forma dos órgãos terem a cultura da transparência como norteadora de comportamento. O que se verificou é que, no momento, há muito que se evoluir nesse sentido, pois as respostas majoritariamente foram em torno do aumento da nota de uma avaliação pública e dos apontamentos do TCE. 

5. Considerações finais

Por fim, cabe um comentário sobre o retorno de apenas 28% (5/18) dos questionários enviados. 

Um dos resultados da própria pesquisa pode ser visto no baixo retorno dos questionários o que poderia ser interpretado como uma certa falta de prioridade por parte dos municípios quanto à prestação de informações aos cidadãos. Pois, a solicitação de informações também pode ser considerada como um dos componentes do campo do direito à informação previsto na LAI; situação está que pode não ter sido compreendida desta forma por parte da maioria dos municípios contatados para a presente pesquisa. 

Neste sentido, este Não-Retorno de respostas pela maioria dos municípios pode ser interpretado como um importante resultado da investigação. Pois, trate-se de municípios cujas notas altas poderiam sugerir que, supostamente, aderiram a práticas de transparência. Essa situação se expressa claramente no item 8 e serve de sugestão para o aprofundamento em futuras pesquisas. Como aumentar a cultura por parte do serviço público do retorno, da transparência e do incentivo ao cidadão na utilização do acesso a informações?

Outros resultados interessantes dizem respeito a análise das várias questões que merecem atenção também ao se tratar de transparência em municípios, que atenderam aos principais critérios desta pesquisa (aumento da RTN > 200%). Ao serem observados os retornos destes municípios, surpreende inicialmente que os principais servidores de gestão desconheciam esse ranking. Os contatos foram focados nos prefeitos e nos gabinetes, que são o centro das demandas de gestão. Situação que concorda com Cruz et al (2012), os quais reforçam a dificuldade de uma explicação sobre o que leva à transparência nos municípios, pois seria coerente que os municípios com notas altas, conforme o último levantamento, estivessem cientes dessas avaliações.

Outra situação revelada é que a existência de um setor específico dentro da prefeitura que cuida da transparência das informações pode ter favorecido o aumento de transparência. Questão que pode ser analisada de forma paralela com a profissão que mais apareceu como responsável pela transparência do município, que foi o curso superior em Direito, seguido de Contabilidade e Administração. Profissões que se mostraram essenciais no contexto de transparência. Resultado que colabora com Santos (2009), o qual defende que a profissionalização é o pressuposto para que as organizações públicas possam ingressar nesse patamar diferenciado.

Sobre a transparência e a relação com a sociedade, tanto sobre esclarecimentos quanto a participação social sobre a interação com os resultados, o artigo reforça que ainda temos muito para desenvolver enquanto democracia participativa. Situação já revelada por Figueiredo; Santos (2013), os quais sugerem como propulsor dessa mudança de comportamento social frente às demandas de transparência, inicialmente, incluir no ensino das crianças e jovens sobre a importância de se exigir transparência dos dados públicos e a busca por espaço nos instrumentos de participação. 

Por fim, cabe analisar que o artigo superou as informações às quais objetivava analisar. Além de confirmar a profissionalização como propulsora de transparência e demonstrar que a organização do quadro de funcionários também é importante do cumprimento de demandas, trouxe o contexto de a sociedade, no momento, não tem a cultura de cobrar pelas informações e acompanhar os resultados da gestão pública. Com isso, preenche-se uma importante lacuna de pesquisa sobre o RNT e a profissionalização dos municípios.

             

 

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